Alcides de Freitas Cruz
- Marcelo da Cruz Côrtes
- há 4 dias
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Alcides de Freitas Cruz nasceu na cidade de Porto Alegre em 14 de maio de 1867 e faleceu em 14 de março de 1916, aos 48 anos. À época, estava em plena atividade como pensador negro que percorreu várias ocupações: foi advogado, tradutor, crítico literário, crítico de arte, produziu pesquisas históricas e geográficas, foi também jornalista, professor jurídico e político brasileiro.
Era filho de Manoel Pinto Lacerda da Cruz e Adelaide Leopoldina de Freitas. Aos 14 anos matriculou-se no Colégio Souza Lobo. Acabou estudando na Escola Militar, atingindo o posto de agrimensor, em 1885. Como tal, prestou serviços nas Estradas de Ferro de Porto Alegre a Cacequi e de Porto Alegre a Uruguaiana. Em 1891, transferiu-se para São Paulo, onde estudou na Faculdade de Direito, obtendo graduação como bacharel.
Em razão da guerra federalista, entre 1893 e 1895 integrou o 7º Batalhão de Infantaria da Guarda Nacional. Acabou, neste contexto, adquirindo a patente de capitão.
Mais tarde, consagrou-se como um dos fundadores da Faculdade de Direito de Porto Alegre, hoje constituída como uma unidade da UFRGS, tendo lecionado nas disciplinas de Direito Administrativo e Filosofia do Direito. Sua biblioteca continha 1.873 volumes e acabou sendo legada à Faculdade de Direito de Porto Alegre. Diante de suas diversas atividades, atuou como correspondente da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro e do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.
Sua contribuição como escritor percorreu vários campos disciplinares, de produção prolixa e múltipla, como já mencionado, tendo se destacado nos estudos da doutrina jurídica à investigação histórica, geográfica e historiográfica.
Produziu ensaios e crônicas jornalísticas e literárias, passando a ter também o status de figura de importância política, atuante na esfera pública da época, o que sifnificava para o movimento negro uma penetração nas discussões profundas no âmbito dos debates ideológicos e estudos avançados da época.
Alcides de Freitas Cruz se colocava como adepto às ideias proudhonianas ( denominação usada para os adeptos da filosofia política e social de Pierre-Joseph Proudhon), obtendo estilos provocativos similares aos do pensador francês. Suas posições reivindicavam maneiras críticas de atuação em relação a outros expoentes de renome da época.
Seja qual for a importância destas temáticas nos veículos de imprensa, tanto na Revista Renascença, do Rio de Janeiro, como no jornal A Federação, de Porto Alegre, podemos encontrar - nas primeiras décadas do século XX - suas posições de crítica historiográfica. Esses artigos assinados por Alcides Cruz analisavam a sociedade da época e a sua relação com obras que ganhavam significativa aderência na ocasião, como a de Juan Amadeo Baldrich, Historia de la guerra del Brasil, Contribución al estudio razonado de la historia militar argentina, de 1905.
Alcides de Freitas Cruz foi também tradutor de diversos livros, comoa primeira obra de Dostoiévski lançada em território brasileiro, conhecida como O jogador, cuja edição foi publicada pela livraria Americana, em 1896, no Almanak Litterario e Estatístico do Rio Grande do Sul.
Ademais, também encontramos Alcides Cruz como tradutor da obra de Thomas Cooley, Princípios Gerais de Direito Constitucional dos Estados Unidos da América, produzida em Porto Alegre pela Livraria Universal, em 1909. Dentre essas várias atividades como tradutor e intelectual, esteve presente no Primeiro Congresso de História Nacional, em 1914.
Quando lançou a obra A vida de Raphael Pinto Bandeira, em 1908, pode encontrar seu estilo que reivindica gêneros de linguagem regional e nacional, seguido de passagens teleológicas em suas narrativas.
Foi redator de jornais e revistas importantes, como do Jornal do Comércio e da revista Gazeta do Foro.
Alcides de Freitas Cruz - podemos assim dizer - utilizou sua posição como advogado e escritor, com sua potência intelectual, para responder às agressões explícitas de preconceito racial que sofreu no exercício de suas atividades, nos jornais e na advocacia.
O pensador negro gaúcho pode vivenciar o que consta em relatos como na obra de Recordações do Escrivão Isaías Caminha, de Lima Barreto, publicada em 1909, após duas décadas da abolição da escravatura, onde a posição de negro era tanto perseguida quanto não aceita em posições que lhe conferiam status social e disposição de cidadania e poder na sociedade.
Temos neste cenário expressões literárias que descrevem muito bem essa realidade social histórica brasileira, onde as pessoas negras são negligenciadas e retiradas dos espaços públicos e de destaque na sociedade, herança de uma cultura escravagista e racializada.
Alcides de Freitas Cruz, ao longo de sua trajetória, encontrou diversas dificuldades decorrentes dos preconceitos sociais com a cor da sua pele devido à incapacidade do país de incorporar pessoas negras à sociedade mesmo depois da abolição.
Assumindo-se mestiço, mulato e negro, incorporando à identidade a luta de seus avôs na construção do país e, com altivez, defendia a história de seu povo, exigindo dignidade e respeito das autoridades que zombavam de suas origens e de seu conhecimento, exclusivamente por ser um homem preto.
Após a sua morte, na primeira metade do século XX, poucas foram as menções de seu legado. E, quando citado, era geralmente de maneira rápida. Alcides de Freitas Cruz foi casado com Severina Pereira da Cruz e deixou uma filha, Zoé Pereira da Cruz.
Seu irmão, Leopoldo de Freitas, também formado em Direito pela Faculdade do Largo de São Francisco, exerceu o cargo de cônsul da Guatemala.
Postumamente, em 1917, a literatura jurídica brasileira ganhou sua obra mais estimada: Teoria e Prática da Demarcação e da Divisão de Terras.
Na condição de deputado estadual de 1891 a 1916, acabou exercendo vários cargos em diversos mandatos, inclusive ocupando a vice-presidente da Assembleia Gaúcha, em 1911.
Seu escritório profissional estava situado na rua da Ladeira, atual General Câmara, nº 35, no Centro de Porto Alegre.
Essa pesquisa tomou como referência as seguintes fontes:
ALMEIDA, Vinicius Furquim de. Das prateleiras da Alcidiana : os livros, a leitura e a escrita na trajetória intelectual de Alcides Cruz. Dissertação (mestrado) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em História, 2018.
CAMPOS, Vanessa Gomes de. Prefácio. Notas de leituras e outros escritos [recurso eletrônico] / Alcides Cruz. Organizado por: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul – Dados eletrônicos - Porto Alegre: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, 2017.
CRUZ, Alcides. Mestiço, mulato ou negro. Organizado por: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul – Dados eletrônicos - Porto Alegre: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, 2017.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO SUL. Homenagem a Alcides Cruz no Centenário de sua morte. Porto Alegre: Publicado no site em 30/03/2016.
FERREIRA, Gregory Mota. Violência e condição humana em recordações da Casa dos Mortos, de Fiódor Dostoiévski. Santa Maria: RS 2021.
KOEHLER, Ana Luiza. Anotações da palestra do Prof. Paulo Roberto Moreira (UNISINOS), em 16/11/2016. Página Beco do Rosário. https://www.analuizakoehler.com/becodorosario/alcides-cruz.
RODRIGUES, Letícia. Painel destaca a trajetória de Alcides de Freitas Cruz. Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. 16/11/2016. Página https://ww4.al.rs.gov.br/noticia/307290 .
Pesquisa de imagem: Leandro Machado
Facebook Luís Carlos Ávila Bagé
Site Histoire Engagée
DAS PRATELEIRAS DA ALCIDIANA: OS LIVROS A LEITURA E A ESCRITA NA TRAJETÓRIA DE ALCIDES CRUZ - Vinicius Furquim de Almeida
Blog Beco do Rosário
HOMENAGEM A ALCIDES CRUZ NO CENTENÁRIO DE SUA MORTE - Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul
Site da Assembléia Legislativa de Porto Alegre - Rio Grande do Sul
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