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Foto do escritorDaniele Machado Vieira

Areal da Baronesa

Atualizado: 14 de out.

Figura 1 – Mapa do Areal da Baronesa, Porto Alegre/RS – 1906

Fonte: Elaboração de Daniele Machado Vieira sobre Mapa de Porto Alegre/RS, 1906 (IHGRGS, 2005).


O antigo Areal da Baronesa era uma grande área, que se estendia do atual Colégio Pão dos Pobres (área da residência do Barão e da Baronesa do Gravataí) até a Av. Ipiranga (antiga Rua dos Pretos Forros). Inicialmente uma zona de chácaras contígua à área central, embora separada desta pelo Riachinho (Arroio Dilúvio antes da canalização), a área foi urbanizada na virada do século XIX para o XX, compondo hoje parte dos bairros Cidade Baixa e Menino Deus. Conforme pode ser observado no Mapa de 1906 (Figura 1), tinha como limites a Av. Praia de Belas à oeste, à leste a Rua 13 de Maio (atual Av. Getúlio Vargas) e o Riachinho; ao norte, a Ponte de Pedra e, ao sul, a Rua 28 de Setembro (antiga Rua dos Pretos Forros, parte da atual Avenida Ipiranga).

Com registros de moradores na região desde meados do século XIX, a origem do arraial está relacionada ao parcelamento da chácara da Baronesa do Gravataí em 1879 (MATTOS, 2000, p. 39). Com o loteamento da chácara em terrenos e a abertura de novas ruas, a área passa a ser conhecida como Arraial da Baronesa. Mas a grande quantidade de areia grossa na região, oriunda do Lago Guaíba, levou ao trocadilho “Arraial” por “Areal”, consagrando o local como Areal da Baronesa, segundo o cronista Sanhudo (1961, p. 186).

Documentos levantados pela pesquisadora Jane Mattos (2000, p. 41) atestam a presença de pessoas negras, livres ou ainda escravizadas, residindo no local já nos anos 1870. Crê-se que libertos na área não eram uma exceção, visto que nessa mesma época surge a Rua dos Pretos Forros (FRANCO, 2006, p. 425; MATTOS, 2000, p. 47), posteriormente denominada Rua 28 de Setembro, data da Lei do Ventre Livre. Limite sul do Areal da Baronesa, a Rua 28 de Setembro aparece pela primeira vez no mapa em 1888, juntamente com a Rua 13 de Maio, limite leste da área. É emblemático que os limites sul e leste do Areal da Baronesa, território majoritariamente negro, fossem denominações que faziam referência a dois marcos da emancipação negra: a Lei do Ventre Livre e a Abolição da Escravidão.


O Areal da Baronesa ficou marcado na memória da cidade pela grande quantidade de terreiros de batuque e pelos animados carnavais. Palco de grandes carnavais, é no Areal que surge o Rei Momo Negro, na figura de Adão Alves de Oliveira, popularmente conhecido como Seu Lelé (GERMANO, 1999). Durante três anos, de 1948 a 1951, o Momo Lelé reina para seus súditos negros. O início do carnaval era precedido por um cortejo, que se iniciava na Ponte de Pedra. Seu Lelé contava que ele saia do Areal, levado de caiaque pelo Lago Guaíba até chegar à Ponte de Pedra e abrir o carnaval.


Então quando chegou na Ponte de Pedra no primeiro ano, aí alguém já avisou para os blocos que estavam lá já em fila indiana de que o Rei Momo estava chegando naquele momento. [...] E aí já começou os clarins a tocar. [...] tocando alto e bem forte. Jogaram uns três ou quatro foguetes. Ali iniciava-se o primeiro carnaval do Areal da Baronesa com o Rei Momo preto (OLIVEIRA, 1991, p. 7 apud Germano, 1999).


Os foliões seguiam em cortejo pela Rua João Alfredo (antiga Rua da Margem) até chegar no Areal. Os carnavais do Areal eram conhecidos como o “carnaval na areia”, pois as ruas eram de chão batido – um areião. O coreto de Seu Lelé ficava na Rua Baronesa do Gravataí, onde hoje encontra-se o Quilombo do Areal, localizado na Travessa Luiz Guaranha, uma das muitas “avenidas” da região. De acordo com os antigos moradores, as avenidas eram moradias coletivas de aluguel, espaço com diversas casas de madeira ou peças, distribuídas ao longo de um pátio ou corredor. O desmantelamento do antigo Areal da Baronesa esteve relacionado à canalização do Arroio Dilúvio, que separava o Areal da cidade. Ao ter seu trecho final retificado, o Riachinho deixa de correr por dentro da Cidade Baixa, possibilitando a incorporação da área do Areal à cidade e às suas lógicas de “modernização” e consequente exclusão das camadas de baixa renda.


Referências


FRANCO, Sérgio da Costa. Porto Alegre: guia histórico. 4. ed. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2006.


GERMANO, Iris Graciela. Rio Grande do Sul, Brasil e Etiópia: os negros e o carnaval de Porto Alegre nas décadas de 1930 e 40. 1999. 275 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-graduação em História, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1999.


MATTOS, Jane Rocha de. Que arraial que nada, aquilo lá é um areal: o Areal da Baronesa: imaginário e história (1879-1921). 2000. 158 f. Dissertação (Mestrado em História do Brasil) – Programa de Pós-graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2000.


SANHUDO, Ary Veiga. Porto Alegre: crônicas da minha cidade. Porto Alegre: Edições Sulina, 1961. 1 v.


SANTOS, Irene (org.). Negro em Preto e Branco: história fotográfica da população negra de Porto Alegre. Porto Alegre: [s. n.], 2005.


SANTOS, Irene (coord.) et al. Colonos e Quilombolas: memória fotográfica das

colônias africanas de Porto Alegre. Porto Alegre: [s. n.], 2010.


VIEIRA, Daniele Machado. Territórios Negros em Porto Alegre/RS (1800-1970): geografia histórica da presença negra no espaço urbano. Belo Horizonte: ANPUR, 2021. Disponível em: https://anpur.org.br/territorios-negros-em-porto-alegre-rs-1800-1970. Acesso em: 25 jan. 2023.



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