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Imagem criada com IA para retratar a distribuíção dos folhetins, mais imagens na galeria abaixo.

O Folhetim do Zaire foi um periódico de comunicação produzido por carnavalescos para a comunidade negra de Porto Alegre, fundado em 1974, pelo músico Mourency Silva Teixeira, o “Moura do Cavaco”. Era produzido artesanalmente, em mimeógrafos e fotocópias.  O músico Moura teve passagens por vários grupos de samba, sendo reconhecido como figura importante na comunidade carnavalesca e assíduo frequentador dos pontos de encontros entre negros e negras, sobretudo entre os carnavalescos da antiga, como à frente da tradicional Confeitaria Matheus, próximo à consagrada Esquina Democrática, localizada na área central de Porto Alegre – ponto de manifestação democrática da diversidade etnicorracial, cultural e política. 


Em 1982, o Folhetim teve alterado seu nome para Folhetim do Zaire, o que vinha das discussões sobre a representatividade e identidade negra ou afro-brasileira impulsionadas pela Copa do Mundo de 1974, na Alemanha, entre uma seleção brasileira e uma seleção africana, neste caso contra a do Zaire (República Democrática do Congo).


A Copa de 1974 foi a primeira transmitida a cores pela televisão e a primeira também a ter um selecionado onde todos os jogadores eram negros: o Zaire. Este fato inédito repercutiu no imaginário social entre os afro-brasileiros e africanos, penetrando os anos 1980, a ponto da Esquina Democrática - encontro das avenidas Borges de Medeiros e Rua da Praia - passar a ser designada de “Esquina do Zaire”. 


O nome do país centro-africano - que de 1971 a 1997 foi denominado Zaire - transformou-se, após essa aparição na Copa do Mundo, numa expressão que se referia também a um conjunto de pessoas negras reunidas em qualquer lugar.

Essa “Esquina do Zaire” passou a sinalizar a intensa sociabilidade pública negra urbana que ocorria na “Esquina Democrática” e adjacências, quase sempre às sextas-feiras, quando diversos segmentos culturais negros e negras circulavam por entre esquinas, ruas, galerias, pontos de encontros e bares da área central. 


Nesta nova fase, O Folhetim do Zaire passou a apresentar um logotipo de identificação com desenho de um negro africano e pigmeu correndo e segurando um jornal na mão direita. Muitas vezes, aparecia com nome de “Adoniran”, em alusão a importante sambista, figurinista, carnavalesco e radialista negro Adoniran Ferreira, já falecido. 


Ao longo das décadas de 1970 a 2010, existiu em Porto Alegre uma imprensa negra carnavalesca representada por três veículos alternativos: os jornais impressos Folhetim do ZaireO Jurado Ensaio Geral. O Folhetim do Zaire passou a fazer parte da mídia alternativa, sendo considerado ainda importante artefato cultural que se prestava a uma pedagogia de um modo de ser negro, em termos ontológicos, o que era omitido pela imprensa burguesa, fenômeno analisado pelo Prof. Dr. Roberto Santos, historiador da Ulbra em sua dissertação de mestrado “Pedagogias da Negritude e Identidades Negras em Porto Alegre: Jeitos de Ser Negro no Tição e no Folhetim do Zaire (1978/.1988), sob a orientação da historiadora Maria Angélica Zubaran (Ulbra), Canoas, 2007. 


O Folhetim do Zaire, por vezes, trazia os seguintes subtítulos: Informativo carnavalesco ou MINI Informativo do SAMBA e do CARNAVAL. No dia 15 de setembro de 1992, por iniciativa do Vereador Wilton Araújo, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre comemorou oficialmente os 10 anos do Folhetim, que havia sido fundado em 1974. O veículo foi homenageado através do seu fundador, Mourency Silveira Teixeira, do patrono Luis Carlos Marques Teixeira e do colaborador Waldemar de Moura  Lima, o Pernambuco, que na ocasião declarou:


O Folhetim do Zaire é, primeiramente, antes de tudo, um grito de revolta contra a imprensa oficial e contra os meios de comunicação em geral que desconsideram, desrespeitam e, propositadamente, se negam a ver a força emergente da nossa cultura de raiz, da nossa cultura negra, tão brasileira e marginalizada quanto nós, brasileiros marginalizados.

Pesquisa de imagem: Leandro Machado


Referências:


BITTENCOURT JR, Iosvaldyr Carvalho Bittencourt. Porto Alegre – do Porto dos Casais a um porto africano - a ocupação negra do centro de Porto Alegre. Comunicação apresentada na 17ª Reunião da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), Florianópolis, 1990.


______.  Relógios da Noite: uma antropologia da territorialidade e da identidade negra em Porto Alegre. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – PPGAS, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1995, 246p.


______. A Esquina do Zaire – Territorialidade Negra Urbana em Porto Alegre. Presença negra no Rio Grande do Sul. (Org.) SEFFENER, Fernando, Porto Alegre: EU/Porto Alegre, 1995, 97p.


______. Territórios negros. (Org.)  SANTOS, Irene. Negro em preto e branco: história fotográfica da população negra de Porto Alegre, Porto Alegre, Fumproarte, 2005, 184p.


______. Territorialidade Negra Urbana: a evocação da presença, da resistência cultural, política e da memória dos negros, em Porto Alegre, delimitando espaços sociais contemporâneos. (Org.) POSSAMAI, Zita Rosane. Leituras da Cidade, Ed. Evangraf, Porto Alegre, 2010, 320p.


GOMES, Roberta Fraga Machado. Turismo e Cidadania: A redenção das Africanidades. Editora Bestiário, Porto Alegre, 2012, 106p.


ORO, Ari Pedro; ANJOS, José Carlos dos; CUNHA, Mateus. A tradição do Bará do Mercado, Poro Alegre, PMA/SMC, CMEC, 2007.


SOMMER, Michelle Farias. Territorialidade Negra – A herança africana em porto Alegre: uma abordagem sócio-espacial, Fumproarte, Porto Alegre, 2011, 184p.


VILASBOAS, Ilma Silva; BITTENCOURT JR, Iosvaldyr Carvalho e SOUZA, Vinícius Vieira de. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre, Ed. Porto Alegre, Vinícius Vieira de Souza, 2010, 172p.

 
 
 

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