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Mãe Rita do Candombe


Mãe Rita é a sacerdotisa de religiões de matriz afro-brasileira mais antiga em Porto Alegre de que se tem notícias. 


O cronista Antônio Álvares Pereira - o Coruja (que viveu entre 1806 e 1889) destacava o papel desta mulher na condução de práticas religiosas associadas à população negra. 


Coruja relata que Mãe Rita liderava um candombe próximo à Várzea, nas cercanias do atual Parque da Redenção, onde “se reuniam nos domingos a tarde pretos de diversas nações, que com seus tambores, canzás, urucungos e marimbas, cantavam e dançavam esquecendo as mágoas da escravidão, sem que causassem maiores cuidados à polícia”.


A historiadora Liane Susan Muller, por sua vez, associa o destaque do papel conferido à iyalorixá no cotidiano da cidade a expulsão dos membros da Irmandade do Rosário, composta em sua grande maioria por negros e pardos.


A expulsão deu-se na Igreja Matriz da Madre de Deus, a atual Catedral Metropolitana, em virtude de verem-se proibidas as danças e cânticos dos negros. Tal prática junto aos rituais de coroação dos reis negros do Congo e da Rainha Jinga fortaleciam a identidade dos pretos de todas as nações que habitavam Porto Alegre. Essa proibição, levada a efeito pelo Vigário José Inácio, em 1809, fez com que a irmandade comprasse um terreno em 1815 visando erguer o primeiro edifício da hoje conhecida igreja do Rosário, inaugurado em 1828.


Mãe Rita, para a maior parte dos pesquisadores, ocupa uma posição de notoriedade na sociedade escravocrata da capital gaúcha por ser tida como fundadora de um terreiro de batuque em Porto Alegre ainda na primeira metade do século XIX. 


O pesquisador Jovani Scherer, no entanto - a partir de novas fontes de pesquisa - não enxerga a existência de condições estruturantes nas primeiras décadas do século XIX para a materialização do batuque enquanto religião constituída, por ser nossa cidade, naquele período, majoritariamente composta por negros de origem banta - que não cultuavam os orixás. 


As condições para a geração de um novo balanço demográfico apareceram paulatinamente após 1850 com a mudança constante e segura do perfil étnico negro do RS, especialmente com a chegada em maior número de representantes das nações Jeje e Fon, de tradição iorubá.


Scherer, assim como Liane Muller, pensa que boa parte das manifestações africanas estavam de alguma forma articuladas ao catolicismo, e por isso mesmo, nem sempre eram toleradas pelos chefes eclesiásticos. 


Retomando Coruja, em sua narrativa do candombe liderado por Mãe Rita, ele descreve essa manifestação como existindo no lugar onde - sob influência da mãe de santo - permitia-se “ensaiar os cucumbis - pelo Natal e nas festas de Nossa Senhora do Rosário - levando a frente o Rei e a Rainha vestidos a caráter, com a juíza do ramalhete e a competente aristocracia negra indo dançar ou antes sapatear no corpo da igreja com guizos nos tornozelos”.


Se não existe unanimidade entre os especialistas sobre o ramo religioso defendido por Mãe Rita, é consenso o seu papel de liderança sociorreligiosa na sociedade escravista do século XIX. 


As narrativas sobre suas atividades são fontes de estudo sobre a localização dos territórios negros no período em que viveu, e sem dúvida Mãe Rita foi marco de inspiração para a profusão de religiosos de batuque e umbanda que foram viver na Colônia Africana, Bacia do Montserrat e outros marcos da territorialidade negra nas primeiras décadas do século XX, sendo seu nome até hoje entendido como essencial para a compreensão do profundo enraizamento das religiões de matriz afro-brasileira na capital gaúcha, fenômeno que sem dúvida contribui para dissolver a narrativa dominante de que não existe influência e presença negra na formação da cidade “mais europeia” do país.


Essa pesquisa tomou como referência diversas publicações:


  • Antigualhas: reminiscências de Porto Alegre. De Antônio Alvares Pereira CORUJA. Porto Alegre: Unidade Editorial, 1996.

  • Dom José. História da Igreja Nossa Senhora do Rosário. De Moacyr FLORES. Porto Alegre, 2004.

  • As Contas do Meu Rosário são Balas de Artilharia. De Liane Susan MULLER. Porto Alegre: Pragmatha, 2013.

  • O Candombe, Um Rei Congo e as tradições africanas em Porto Alegre, no início do século XIX. Racismo, relações de poder e história negra em Porto Alegre: séculos XIX-XX. De Jovani de Souza SCHERER. Publicado pelo Centro Histórico-Cultural Santa Casa com organização de José Rivair Macedo, Paulo Roberto Staudt Moreira e Vera Lúcia Maciel Barroso. Porto Alegre: 2023.


Pesquisa de imagem: Leandro Machado


 
 
 

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