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Conheça o projeto!

O PROJETO MEMÓRIAS NEGRAS EM VERBETES – Inventário Participativo de Referências Espaciais, Sociais e Simbólicas realiza um levantamento visando o resgate e desapagamento da presença das populações negras na história de Porto Alegre.

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Verbetes

Atualizado: 14 de out. de 2024



Construído para ser centro de compras e abastecimento de alimentos da cidade, o Mercado de Porto Alegre foi erguido entre 1867 e 1869 por mão de obra negra escravizada. Inaugurado em 1870, era originalmente um quadrilátero formado por um piso e quatro torreões nas extremidades e a execução da obra exigiu o aterramento de parte do Lago Guaíba. Sua forma atual foi realizada em 1912 com a incorporação de um segundo pavimento, momento em que foram elaborados nas suas fachadas os elementos decorativos que dão à edificação o aspecto neoclássico que ostenta até os dias atuais. Também é importante destacar que, ao longo da sua história, o velho mercado sofreu quatro incêndios: o primeiro em 1912 de grandes proporções, outros dois em 1976 e 1979 e, o último, em 06 de julho de 2013, que consumiu quase a metade do segundo pavimento. O prédio é tombado na condição de monumento histórico desde 1979, e passou por uma restauração entre 1992 e 1997 que trouxe ao edifício a cobertura que possui hoje em dia e a retirada de uma banca que ocupava o centro do mercado deixando livre o cruzeiro proporcionado pelo cruzamento dos corredores advindos das quatro portas que caracterizam a edificação.


No entanto, para falar das profundas relações estabelecidas entre o Mercado e a comunidade negra será necessário um exercício para deslocar o eixo de análise, que antes repousava na natureza do objeto como elemento determinante do conceito de patrimônio, ou seja, deixar de ver apenas o Mercado, prédio histórico e elemento marcante na arquitetura do Centro, para prestar atenção nas relações que se estabelecem entre o Mercado e os diferentes sujeitos – da comunidade negra – no tempo e no espaço. Nesse sentido, se vai recorrer à relação patrimonial com o Mercado Público que firmam os grupos de sacerdotes de religiões afro-brasileiras e os militantes do movimento negro.


A presença cotidiana de Yalorixás e Babalorixás no Mercado está associada à Tradição Bará do Mercado – registrada como patrimônio imaterial de Porto Alegre. Essa tradição é viva porque se retroalimenta da energia advinda da prática (ritual do passeio e ofertas jogando-se moedas ou balas de mel) de reverenciar e buscar o axé do orixá. É vista como um símbolo da resistência ao apagamento da memória negra. A pesquisa de Vargas (2011) destaca o depoimento de um sacerdote:


Com certeza ali tem algo mais do que simples espaço comercial. É uma construção (o mercado) de negros, a gente compreende que essa energia (axé) do Bará, que foi enterrado ali pelos escravos ou pelo Príncipe Custódio, é também do próprio negro, é uma história de resistência [...]. Quando o filho sai do terreiro, primeiro contato com o mundo é a relação com o mercado, que é símbolo da resistência do nosso povo, a memória de toda a contribuição dada pelo povo negro para a sociedade gaúcha.


A ideia de resistência ao apagamento da memória está relacionada à longevidade da prática religiosa no interior do Mercado. Outro sacerdote complementa:


Nasci numa casa de religião, Oió, e desde os sete anos de idade ia ao Mercado fazer obrigação. Nasci em 1935, minha mãe em 1915 e minha avó em mil oitocentos e pouco e todas iam ao Mercado, iam defendendo nossa raça e querendo fazer as coisas para o negro. O Bará do Mercado é nossa tradição de luta, de resistência e que não pode se perder.


Ponto que ainda merece destaque é o fato de que até o processo de restauração do Mercado (1992-1997) a prática de reverenciar Bará era pouco conhecida para além dos próprios sacerdotes. A visibilidade desta prática trouxe a necessidade de construir uma narrativa voltada para a sociedade mais ampla sobre as origens do assentamento ao orixá Bará no cruzeiro que marca o centro do Mercado. De maneira sintética, a responsabilidade por assentar o orixá é dada aos trabalhadores escravizados que trabalharam na construção do prédio entre 1867 e 1869 ou ao Príncipe Custódio, personagem complexo que merecerá um verbete próprio. A mão do Príncipe vai conferir um ato nobre à formação das religiões afro-brasileiras em Porto Alegre.


A prática ritual e as versões sobre o assentamento de Bará são fontes para se pensar sobre os territórios e os deslocamentos das populações negras no tempo e no espaço. O ritual do Passeio que é a prática de se apresentar os novos sacerdotes ao orixá, com algumas variações, contempla a entrada dos grupos de religiosos pela porta do Largo Glênio Peres, o ritual no centro do Mercado, a saída pela porta da Avenida Júlio de Castilhos, antiga Doca do Peixe e paisagem do Guaíba, como reverência a Oxum, a entrada pela porta da Avenida Borges de Medeiros e a saída pela Praça Parobé, lembrando a peregrinação com destino à Igreja do Rosário dos Pretos. Este trajeto pode ser comparado à grande circulação de negros na área do Mercado no século XIX.


Já Custódio, que faleceu em 1935, é apontado por realizar e orientar outros assentamentos em pontos diversos da cidade. O príncipe residia na Cidade Baixa e, segundo relatos de sacerdotes, até os anos 1940, outros religiosos como Antônio de Oxum, Chico de Iemanjá, Paulino de Ogum e Idalino de Ogum assentaram sete Barás em Porto Alegre sendo eles colocados na Cidade Baixa; na Colônia Africana; na Bacia do Montserrat; na Ponta do Guaíba; e na região da Usina do Gasômetro.


O outro grupo aqui citado, os militantes do movimento negro, desenvolveu também uma relação especial com o Mercado. Estes destacam o segundo piso, por ter sido local de resistência e oposição ao regime militar (1964-1985), onde ficavam instaladas livrarias e outros equipamentos culturais, sendo ainda lugar de reuniões e nascimento do Movimento Negro Unificado (MNU). Alguns bares e outros pontos são vistos como enclaves negros e continuação da presença negra naquela área do centro, por exemplo, o grupo de estivadores que trabalhava no porto da cidade.


O Mercado é entendido como o centro de onde se irradiam todas as manifestações e reivindicações do povo negro. Por ter sido construído por mão de obra compulsória ou escravizada, é percebido como um monumento negro por ser uma obra que espelha a contribuição do negro para a cultura gaúcha.


O local é, talvez, o patrimônio edificado mais importante da capital. Concorda-se com o antropólogo Antônio Arantes quando ele diz que espaços edificados exercem significativo caráter reflexivo sobre a ação social, ou seja, ao encaminhar marchas e ações saindo do Mercado, o movimento negro incorpora às suas reivindicações e demandas a história e a importância espaço para a comunidade negra.



Referências:


VARGAS, Pedro Rubens. A relação patrimonial na restauração de bens culturais: o mercado de Porto Alegre e os caminhos invisíveis do negro. Curitiba: Appris, 2017.


LORENTZ, Kátia B.; GIOVANAZ, Marlise. Relatório de Pesquisa Mercado Público Central de Porto Alegre Parte I. Porto Alegre: SMC/PMPA, 2003


Atualizado: 14 de out. de 2024



O jornal O Exemplo (1892 - 1930), como outros, colaborou para uma memória distinta sobre a negritude brasileira. O periódico teve algumas interrupções e retornos, que marcam suas 3 fases. O periódico destacou-se pela construção de narrativas e múltiplas vivências de mundo do povo negro em um território de lutas éticas marcado por diversos fatos significativos para sua comunidade, valorizando e contribuindo com ela, bem como mostrando as discordância na sociedade vigente no período.


No momento que se lê o jornal, as memórias parecem vivas e se encontram justamente nos acontecimentos que demonstram a necessidade de cuidados para a preservação das memórias históricas e culturais dos negros. É possível considerar que O Exemplo, assim como outros periódicos negros, foram recursos que contribuíram na construção de uma memória sobre o negro no Brasil, a partir de uma relação, ou seja, conexão de proximidade, não só em relação ao sistema escravocrata, mas sim de luta e resistência em outros campos.


O Exemplo foi fundado após reuniões diárias no Salão Calisto, de Calisto Felizardo de Araújo e filhos. Seu escritório foi usado durante a primeira fase (1892-1897). O Salão Calisto localizava-se na rua dos Andradas, número 247, no centro da cidade de Porto Alegre, feito por e para pessoas negras.


O editor Arthur de Andrade descreveu O Exemplo como um jornal “literário, crítico e noticioso”. Entre os membros estavam Arthur Ferreira de Andrade, Marcílio Francisco da Costa Freitas, Arthur Pinto Gama, Alfredo Cândido de Souza, Sérgio Aurélio de Bittencourt, Aurélio Viríssimo de Bittencourt Júnior, Florêncio Calisto Felizardo da Silva e Esperidião Calisto Felizardo da Silva, que completa a lista da primeira fase do periódico.


A primeira fase do jornal encerrou-se no dia 21 de janeiro de 1897. Ele voltou a funcionar em 5 de outubro de 1902, retomado pelo fundador Esperidião Calisto e pelos novos membros Tácito Pires e Vital Batista, os dois do movimento operário da capital. Esta fase estendeu-se até 1911, com alguns intervalos.


A última fase foi entre 1916 e 1930. O jornal teve uma movimentação feminina, algo que acontecia em poucas associações negras porto-alegrenses. A publicação teve duas colaboradoras bem ativas: Sophia Ferreira Chaves e Carmem D’Aguiar, ampliando o campo de possibilidade de entendimento sobre as relações e inquietações das mulheres nos demais projetos coletivos além do jornal O Exemplo.


O periódico nasceu nesse campo, no combate aos preconceitos que atingiam a população negra. Ademais, havia também uma disputada pela narrativa histórica, indo ao encontro a uma das palestras que se tornou um livro da escritora Chimamanda Ngozi Adichie, O perigo da história única (2019), e, também, do já descrito pela historiadora Beatriz Nascimento, que destacou em seu livro Eu sou Atlântica (2006) que a história da raça negra ainda está por fazer, dentro de uma história do Brasil ainda a ser feita. Beatriz propunha, como projeto, uma interpretação histórica do Brasil que colocasse no centro da análise a racialização das relações sociais e históricas.


Um dos fundadores de O Exemplo, Marcílio Francisco da Costa Freitas, destaca um trecho no jornal nessa mesma linha das autoras referidas comentando que “não haveria o 15 de novembro se não fosse o 13 de maio.” Isso nada mais é que o protagonismo da população negra sobre a história do Brasil.


Na segunda fase, Tácito Pires, um dos membros do jornal O Exemplo, e um dos fundadores, Esperidião Calisto, buscaram criar uma escola noturna. Num dos exemplares do periódico da época vinha um anúncio do “Ateneu Popular”. Ali estavam indicadas as ideias e os motivos que estimularam a criação de escola noturna desse tipo e para quem ela era destinada. Eles nomearam de Escola Noturna O Exemplo, com a intenção de proporcionar um melhor “destino social” às crianças, e levantar intelectual e moralmente a classe.


Em 1908 foi a vez da proposta da criação do Asilo Treze de Maio para acolher crianças abandonadas, sobretudo as “de cor preta e parda” que não eram aceitas nas instituições que cuidavam desse serviço. Mas tanto a escola quanto o asilo não tiveram continuidade em razão da escassez de recursos materiais das coletividades envolvidas. Por isso e também pelo posicionamento negligente do Estado diante dessas demandas.


A última fase foi a da ideia de voltar esses estabelecimentos de ensino para as crianças vulneráveis, buscando assim cobrar que as instituições teriam que ensiná-las de modo a garantir o seu aprendizado. O jornal era destinado para a população negra. Os membros do grupo que o fundou era de pessoas negras letradas e, diante de todas as discriminação que eles, mesmo letrados, sofriam junto à população negra sul do país, sua luta era por direito à educação, cidadania e contra o preconceito de cor (racismo).



Referências


ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

SOUSA, Ricardo Costa. Redes de sociabilidades no jornal o exemplo (1892-1905). In: Anais do III Seminário de Educação, Conhecimento e Processos Educativos: educação e formação humana, 2019. Criciúma: Ed. UNESC, 2019.


MÜLLER, Liane S. As contas do meu rosário são balas de artilharia: irmandade, jornal e associações negras em Porto Alegre (1889-1920). 1999. Dissertação (Mestrado em História) – PUCRS, Porto Alegre, 1999.

PERUSSATTO, Melina. Arautos da liberdade: educação, trabalho e cidadania no pós abolição a partir do jornal O Exemplo de Porto Alegre (1892-1911). 2018. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.

PINTO, Ana Flávia Magalhães. A imprensa negra no Brasil do século XIX. São Paulo: Selo Negro, 2010.


RATTS, Alex. Eu sou atlântica. Sobre a trajetória de vida de Beatriz Nascimento. São Paulo: Imprensa Oficial, 2006.


ZUBARAN, Maria Angélica. O Acervo do Jornal O Exemplo (1892-1930): patrimônio cultural afro-brasileiro. Revista Memória em Rede, Pelotas, v. 7, n. 12, 2015.



Nossos objetivos na 2ª edição

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Confira as metas da segunda edição do projeto MEMÓRIAS NEGRAS EM VERBETES – Inventário Participativo de Referências Espaciais, Sociais e Simbólicas Projeto realizado com recursos da Lei Complementar nº 195/2022. 

01

+ 50 Verbetes no site

A segunda edição prevê em suas metas a publicação de mais 50 verbetes, totalizando 100 verbetes no blog até o final desta etapa.

03

Mobilização da comunidade

Mobilizar pessoas representativas e instituições do movimento negro porto-alegrense para debater o projeto.

02

Audiodescrição dos conteúdos do site

Nosso projeto agora terá o recursos de audiodescrição, tornando a pesquisa acessível a mais pessoas.

04

Audiolivro

Montar Audiolivro unindo os episódios do Desapaga POA e do Memórias Negras em Verbetes.

Reportagens

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Verbetes em destaque

O Príncipe Custódio, figura histórica envolta em mistério, faleceu em Porto Alegre em 1935 e nasceu na África no século XIX. Duas narrativas principais disputam sua origem: uma o vincula à realeza do Benin, atribuindo-lhe importância no batuque e no assentamento do Bará do Mercado, enquanto outra o identifica como filho de um comerciante de escravos africano, chegando a Porto Alegre após disputas familiares. Custódio se destacou na cidade tanto por sua participação nas corridas de cavalos quanto por sua liderança religiosa, sendo reconhecido por sua influência nos cultos africanos e por seu papel de mediador entre a população negra e a elite. Seu legado segue relevante para o movimento negro e para as discussões políticas e religiosas no Rio Grande do Sul.

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Príncipe Custódio

Lupicínio Rodrigues, nascido em Porto Alegre em 1914, destacou-se como um dos maiores compositores da música brasileira, conhecido como o mestre da "dor de cotovelo". Desde cedo, transitou pela boemia e pela música, conciliando sua trajetória com uma breve passagem pelo exército e uma vida marcada por empreendedorismo e engajamento social. Suas composições, como Se Acaso Você Chegasse e Nervos de Aço , tornaram-se clássicos, interpretados por grandes nomes da música. Gremista fervoroso, compôs o hino do Grêmio e participou ativamente da cena cultural e política, chegando a disputar uma eleição. Mesmo reconhecidos nacionalmente, episódios de racismo, o que reforçou seu papel na luta pelos direitos da comunidade negra. Faleceu em 1974, deixando um legado imortal na música popular brasileira.

Lupicínio Rodrigues

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Tambor – Museu de Percurso do Negro

O Tambor Amarelo, instalado na Praça Brigadeiro Sampaio em 2010, tornou-se um símbolo da presença e trajetória do negro em Porto Alegre, sendo um marco do Museu de Percurso do Negro. Concebido por um coletivo de artistas e griôs, com base em uma pesquisa antropológica de Iosvaldyr Bittencourt, a obra foi desenvolvida em um processo coletivo inspirado em valores civilizatórios africanos. Além de resgatar a memória negra no antigo Largo da Forca, o tambor representa a diversidade cultural afro-brasileira e denuncia a pouca representatividade da cultura africana nos monumentos da capital gaúcha. Hoje, a escultura fortalece a identidade negra e ressoa com imigrantes africanos e latino-americanos que chegam ao Rio Grande do Sul. O trabalho dos artistas e griôs envolvidos reforça a importância da arte coletiva e da ancestralidade na construção da memória urbana. Mais do que um monumento, o Tambor Amarelo é um convite ao reconhecimento e à valorização da história negra na cidade.

Pelópidas Thebano Ondemar Parente (1934-2022) foi um renomado artista plástico, desenhista e figurinista de Porto Alegre, destacando-se na arte afrocentrada e no carnaval da cidade. Servidor público por décadas, contribuiu com projetos arquitetônicos e participou da concepção do Aeromóvel. Suas obras abordam a diáspora africana e a identidade negra, refletindo sobre a influência cultural afro-brasileira. Foi um dos idealizadores da Frente Negra de Arte e autor de marcos visuais do Museu de Percurso do Negro, como o Tambor Amarelo. Seu legado é reconhecido em diversas exposições e premiações, consolidando-o como uma referência na arte negra no Rio Grande do Sul.

Pelópidas Thebano

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Wilson Tibério (1916-2005), conhecido como Tibério, foi um artista afro-brasileiro engajado no debate antirracista e colonialista do século XX. Natural de Porto Alegre, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou na Escola Nacional de Belas Artes, destacando-se por sua arte voltada à vivência da população negra. Em 1947, emigrou para a França, viajando por diversos países e se aproximando do movimento Négritude. Sua produção artística denunciava o colonialismo e exaltava a diáspora africana, com obras que hoje integram acervos como a Pinacoteca Ruben Berta, a UFRGS e o Museu Afro Brasil.

Wilson Tibério

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A Ilhota era uma pequena porção de terra na Cidade Baixa, Porto Alegre, formada pelo meandro do Arroio Dilúvio e delimitada pelas atuais avenidas Getúlio Vargas e Érico Veríssimo. Surgida em 1905, tornou-se um núcleo habitado por uma população majoritariamente negra e de baixa renda, conhecida por sua forte tradição boêmia e carnavalesca, sendo berço do samba e lar de Lupicínio Rodrigues. Com a canalização do Arroio Dilúvio após a enchente de 1941, a área foi alvo de interesse imobiliário e sofreu uma brutal remoção populacional no final da década de 1960, deslocando muitos moradores para a Restinga, então uma periferia sem infraestrutura adequada.

Ilhota

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Durante o século XIX, os Campos da Redenção, inicialmente uma grande várzea alagadiça fora da cidade de Porto Alegre, foram um importante local para celebrações culturais e religiosas da população negra, como o Candombe da Mãe Rita e outros batuques, realizados com tambores e danças. Esses festejos, mencionados por cronistas da cidade, ocorreram especialmente na área ao redor da atual rua Avaí e nas proximidades da Capelinha do Bom Fim. Em 1884, a Várzea foi oficialmente renomeada para Campos da Redenção para comemorar a libertação dos escravizados em Porto Alegre, embora a abolição tenha sido limitada e parcial, com muitos negros ainda vivendo como libertos ou escravizados. A nova denominação refletia o legado da resistência e presença cultural dos negros na cidade.

Campos da Redenção

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Dario de Bittencourt, nascido em 1901, foi um importante advogado, educador e ativista negro, com uma trajetória marcada pela luta contra o preconceito racial e pela valorização das tradições culturais negras. Criado por seu avô após a morte do pai, Dario teve uma educação privilegiada, estudando em instituições renomadas e se graduando em Direito pela Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. Ao longo de sua vida, foi membro ativo de diversas organizações negras, como a Sociedade Beneficente Floresta Aurora e o Grêmio Náutico Marcílio Dias, e participou ativamente do jornal O Exemplo, que combatia o racismo. Além disso, Dario se envolveu com religiões de matriz africana, defendendo a aceitação do Candomblé como religião legítima. Em sua carreira acadêmica, foi professor catedrático de Direito Internacional Privado na Universidade do Rio Grande do Sul e se aposentou em 1957, mantendo seu compromisso com a luta contra a discriminação racial até sua morte.

Dario de Bittencourt

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Em 2 de julho de 1949, a Folha da Tarde fez um convite aberto aos homens de cor de Porto Alegre para a fundação de um clube náutico, inicialmente chamado José do Patrocínio, mas que recebeu o nome de Marcílio Dias, em homenagem ao intelectual negro. O Clube foi criado com o objetivo de proporcionar aos jovens negros o acesso a esportes como remo e natação, atividades que eram negadas pelos clubes brancos da cidade. Fundado em 4 de julho de 1949, o clube teve como principais articuladores figuras como João Nunes de Oliveira e Armando Hipólito dos Santos. Em 1950, abriu oficialmente sua sede na Avenida Praia de Belas, sendo um ponto de encontro para festas e eventos importantes da comunidade negra local. Na década de 1960, o clube lançou o jornal Ébano, e embora tenha enfrentado dificuldades com sua sede, incluindo a construção de um ginásio destruído por ventos fortes, o clube seguiu promovendo atividades até seu fechamento na década de 1970.

Clube Náutico Marcílio Dias

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A área do atual bairro Mont'Serrat, até meados do século XX e talvez até as décadas de 1980/90, era conhecida como a Bacia do Mont'Serrat, um território predominantemente negro com registros desde o início do século XX. O bairro teve sua origem marcada pela presença de famílias negras, com destaque para a Rua Arthur Rocha, nomeada em homenagem ao dramaturgo negro Arthur Rodrigues da Rocha. A Bacia do Mont'Serrat foi uma área de forte religiosidade, com várias casas de batuque e terreiros de matriz africana, e se tornou um ponto de encontro de trabalho e sociabilidade para as famílias negras da região, com destaque para atividades como a lavagem de roupas e o trabalho de costureiras. Além disso, o bairro foi berço de tradições culturais como blocos de carnaval e piqueniques dominicais. No entanto, com o processo de urbanização e transformação social, o antigo território negro se perdeu, embora ainda resista uma presença negra na região.

Bacia do Mont'Serrat

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