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Conheça o projeto!

O PROJETO MEMÓRIAS NEGRAS EM VERBETES – Inventário Participativo de Referências Espaciais, Sociais e Simbólicas realiza um levantamento visando o resgate e desapagamento da presença das populações negras na história de Porto Alegre.

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Verbetes

Atualizado: 14 de out. de 2024





Inaugurado em 20 de novembro de 2014, o Painel Afro-brasileiro é a quarta obra registrada no circuito do Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre. Esta obra é, sem dúvidas, um instrumento poderoso de evocação de memórias. O painel cerâmico multicolorido foi montado como se fosse uma moldura no muro do Chalé da Praça XV de Novembro, quase em frente ao Mercado Público, e chama atenção pela sua força imagética e pela presença negra perene no território originário da formação da capital gaúcha. O local onde está instalado, uma releitura de uma esquina do tempo, é uma reafirmação de um espírito do lugar: agrega edificações do século XIX com intervenções urbanas contemporâneas, mas mantendo a característica de ser ponto de grande circulação de pessoas e de manifestações sociais e políticas. É desse lugar que o painel grita “sempre estivemos aqui”, um sopro contra a invisibilidade da população negra na história da cidade.


A concepção desta obra, no entanto, se inicia em 2009, com a produção dos primeiros desenhos e ensaios por parte de Pelópidas Thebano (1934-2022), ainda no Castelinho Cultural do Alto da Bronze, onde se reuniam artistas e griôs responsáveis pelos projetos de criação do Museu de Percurso. Lá estavam, entre outros, Nilo Feijó (1934-2016), Nego Lua, Elaine do Mocambo, o pesquisador Iosvaldyr Bittencourt e o jovem artista Leandro Machado. O Painel é uma síntese dos valores civilizatórios da comunidade negra praticados ao longo da vida do mestre artista pela vivência nos espaços de sociabilidade negra.


Para a execução da obra, diz o arquiteto e escultor Vinícius Vieira, milhares de fragmentos cerâmicos irregulares nas cores verde, amarelo, vermelho, preto, laranja e cinza foram cortados e castilhados à mão, um a um. Com isso, montados e, gradativamente, formando e construindo todas as representações originalmente concebidas por Thebano. Estas representações e as tramas com a história do negro em Porto Alegre foram trabalhadas e recriadas por adolescentes residentes no Quilombo do Areal, sob orientação do Grupo de Trabalho Angola Janga e do professor Arilson dos Santos Gomes.


Referências:


VARGAS, Pedro R. O Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre ou, para muitos, a surpreendente história de um museu que não parece museu dedicado a um gaúcho que não é percebido como gaúcho. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015


SOUZA, Vinicius Vieira. Artes Visuais de Referência Afro-brasileira no espaço público de Porto Alegre. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015


SANTOS, Arilson Gomes; ESPÍNDOLA, Maria Elaine; XAPLIN, Adriana; ROSA, Elza Vieira. Depoimentos dos professores do Curso de Formação de Jovens Monitores de Percurso. In: RAMOS, Jeanice D; VARGAS, Pedro R; SOUZA, Vinicius V. Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre: etapa IV. Porto Alegre, Editora Porto Alegre: 2015


Atualizado: 14 de out. de 2024



Oliveira Ferreira da Silveira nasceu em Rosário do Sul (RS), no distrito de Touro-Passo, na Serra do Caverá, em 16 de agosto de 1941. O mundo da poesia apresentou-se a Oliveira Silveira ainda na infância, por meio de causos, poemas e versos entoados nas rodas de chimarrão nos galpões da campanha gaúcha, herdado da mãe e dos tios dedicados à música. Já em torno dos anos 50, seu talento foi revelado na forma de poesia regional, disseminada pelo jovem poeta no jornal e na emissora de rádio de sua cidade natal. Aos 18 anos, juntamente com um grupo de amigos, deixava os pais, os cinco irmãos e as lembranças da comunidade negra do Rincão dos Ferreira, em Rosário do Sul, para tentar a vida em Porto Alegre.


Ingressou e foi estudante do Colégio Estadual Júlio de Castilhos, para cursar o ginásio, entre 1959 e 1961, quando fez o Clássico e tendo sido eleito Secretário de Imprensa e Divulgação do Grêmio Estudantil. No Jornal “Julinho” publicou alguns de seus poemas. Diplomado em Letras – português e francês (Ufrgs), onde iniciou seus estudos literários, em 1962, entrou em contato com a obra de Aimé Césaire (1913-2008), Léopold Senghor (1906-2001), René Depestre (1926-), Langston Hughes (1901 – 1967), León-Gontran Lamas (1912-1978) e outros pensadores negros. Numa ocasião, Oliveira Silveira afirmou o seguinte: “Vivi a literatura, eu lia e escrevia. Eu procurei a Lara Lemos [escritora e professora gaúcha], foi professora no Julinho [Colégio Estadual Júlio de Castilhos], mas não a conhecia. Ela convidou-me para ir a sua residência e me deu o livro “Reflexões Sobre o Racismo”, de Jean-Paul Sartre, no qual tinha a parte do Orfeu Negro, onde ele fez análise da poesia malgaxe, um comentário sobre a poesia de Leopoldo Senghor [1906-2001]”. De acordo com o poeta Oliveira Silveira, surgiu ali “a oportunidade de intercâmbio com muitos poetas”. Durante esse período, quando era estudante universitário, Oliveira aliou à militância contra a ditadura militar sua consciência racial, vindo a produzir seus primeiros poemas e começar sua atuação política pela causa negra, enormemente motivada pela poesia. Para o poeta, contudo, “a militância mesmo veio depois de graduado no final da década de 1960”.


Existiam em Porto Alegre de fins do século XIX várias instituições ligadas ao associativismo negro: a Sociedade Floresta Aurora (1872), o jornal O Exemplo (1892), a Associação Satélite Prontidão (1904) e outras entidades como o Clube Náutico Marcílio Dias, a Sociedade Nós Os Democratas, a Fica Ahi Pra I Dizendo e a Sociedade Cultural Ferroviária Treze de Maio, em Porto Alegre, Pelotas e Santa Maria. Contudo, a juventude negra da geração de Oliveira Silveira estava distante dos antigos intelectuais fundadores e, ao mesmo tempo, entrava em contato com as estéticas artísticas, poéticas e da linguagem teatral que traziam referências da negritude francófona e que reagiam aos impactos dos debates e lutas de independência no continente africano.


Oliveira Silveira, por esta época, também lecionou Língua Portuguesa e Literatura no Ensino Médio, na Escola Cândido de Godoy, em Porto Alegre. Aposentado do magistério, continuou participando de publicações coletivas, artigos jornalísticos, palestras e encontros com autores e estudantes. O escritor estabeleceu-se em Porto Alegre, em 1959, vindo a morar na Pensão Pelotense, na Rua Lima e Silva, depois, numa residência da JUC (Juventude Universitária Católica), e depois numa pensão, muito próxima do clube negro Floresta Aurora.


O escritor Silveira manteve sempre contato com o universo artístico-cultural da literatura afro-brasileira, sobretudo com o grupo Quilombhoje, de São Paulo, tendo participado de diversas edições do Cadernos Negros e de outras antologias organizadas por membros deste grupo, entre os quais estão Miriam Alves, Éle Semog, Paulo Colina, Geni Guimarães, José Carlos Rivera, Esmeralda Ribeiro, Oswaldo de Camargo, Jônatas Conceição, Cuti e outro(a)s. Acompanhou com interesse o desenrolar da poesia afro-brasileira, tendo escrito sobre a obra do poeta de Juiz de Fora, Edimilson de Almeida Pereira, o que gerou o artigo intitulado “De repente um poeta madura nas Gerais”. Escreveu também sobre Luiz Gama e Oswaldo de Camargo, entre outros. Trabalhou na tradução parcial ou em progressão de Cahier d’um retour au pays natal, de Aimé Césaire, embora nunca tenha chegado a publicá-la. De acordo com Oliveira Silveira, durante o período acadêmico, “...estava ligado na política estudantil.


O poeta Oliveira Silveira fundou e integrou o Grupo Palmares, no final da década de 1960 e início da década de 1971, quando assinalou pela primeira vez a data, realizando ato em homenagem ao Estado Negro dos Palmares, assim propondo uma alternativa para as infundadas comemorações do dia 13 de maio, data alusiva à Abolição da Escravidão. Anteriormente, as propostas começaram, inicialmente, dos encontros informais na Rua dos Andradas (Rua da Praia), esquina com a Rua Mal. Floriano, no centro de Porto Alegre, congregando estudantes negros universitários de várias áreas. Nos debates, surgiu uma série de questionamentos sobre o “treze-de-maio”, considerada a farsa da abolição. Em seguida, foram criadas então uma série de estudos sobre a história de Palmares, e o próprio grupo ali formado adotaria esse nome. Os textos e escritos de Zumbi, fascículo da Editora Abril na série Grandes Personagens da Nossa História, além de pesquisas de Edison Carneiro (1912-1972) e de Ernesto Ennes (1881-1957), passaram a circular entre os participantes.


A primeira reunião de fundação do Grupo Palmares ocorreu na rua Tomás Flores, 303, no bairro Bom Fim, quando, na data de 20 de julho de 1971, foi proposta a criação do grupo e a celebração da morte de Zumbi: 20 de novembro. Oliveira teve o cuidado de registrar os nomes de outros participantes: José Maria Viana Rodrigues (1918-1970), Maria Araci Rodrigues, Jovelina Godói Santana, Julieta Maria Rodrigues e sua filha Naiara Rodrigues Silveira. Depois, se juntariam ao grupo Antônio Carlos Côrtes e Ilmo da Silva.


Entretanto, para o poeta, um dos maiores contestadores do 13 de maio era um “preto alto chamado Jorge Santos ou dos Santos, ator nato, não burilado. Mas ele não foi a reunião inicial e nem integrou-se ao grupo”. Os iniciadores, de fato, do Grupo Palmares, em 20 de julho de 1971, foram Antônio Carlos Côrtes, Ilmo Silva, Oliveira Silveira e Vilmar Nunes. Depois foram chegando as negras universitárias Anita Leocádia Prestes Abad, Helena Vitória dos Santos, Marisa Souza da Silva e Nara Helena Medeiros Soares (falecida). Ainda naquele ano de 1971, contrariando outras propostas que pretendiam destacar os nomes de Luiz Gama (1830-1882), José do Patrocínio (1853-1905) – sempre lembrados nas atividades da Sociedade Floresta Aurora -, o Clube Náutico Marcílio Dias foi escolhido como o local em que o grupo homenagearia Zumbi dos Palmares (1655-1695). A sugestão de “evocar Vinte de Novembro” foi uma proposta de Oliveira Silveira, que lembrou das analogias feitas com Tiradentes (1746-1792), o qual depois de participar da Inconfidência Mineira de 1789, acabou enforcado em 1792, transformado então em símbolo republicano a partir de 1870 e consagrado como herói nacional no fim do século XIX e início do século XX. As mulheres integrantes do Grupo Palmares, também participaram do primeiro ato evocativo do 20 de Novembro, no clube negro Clube Náutico Marcílio Dias. Na primeira comemoração pública do Vinte de Novembro, quem compareceu e “assistiu anonimamente” ao ato foi o historiador Décio Freitas (1922-2004) – cujo livro Palmares: La guerrilla negra, publicado em Montevidéu em agosto de 1971, acabara de sair, mas era ainda pouco conhecido no Brasil. Em sua memória, Silveira destaca que Décio Freitas ofertou-lhe o livro discretamente, ao final do ato. A ideia, portanto, não havia sido do historiador.


Em 1977, Oliveira Silveira também estava entre os militantes do Movimento Negro que propunham a data de 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra, que alcançou posteriormente repercussão nacional, vindo o MNUCDR (Movimento Negro contra a Discriminação Racial) a ratificar a referida data em 1978. Nessa altura, também havia o enfrentamento à Ditadura Militar e, por esta razão, foram inviabilizadas manifestações de toda ordem, inclusive as de cunho racial.


Oliveira Silveira integrou-se perfeitamente à corrente formada pelos poetas afrodescendentes engajados na valorização do negro e de sua cultura, distinguindo-se dos demais, porém, pela busca simultânea de uma identidade negra e gaúcha. Em sua poesia inscrevem-se o manancial do falar gauchesco e quadro referencial do pampa, aos quais vêm associar-se elementos da presença negra – ocultados pela historiografia oficial no Sul do país. Desta forma, seus poemas afro-gaúchos apresentam aspectos poucos conhecidos da história no Rio Grande do Sul, como a existência de todas as formas de numerosos quilombos, além de sua participação efetiva em diversas revoluções. O resgate de lendas do Sul do país, como a do Negrinho do Pastoreio e a do Negro Bonifácio, e sua reelaboração poética a partir de uma ótica negra, colocam Oliveira Silveira entre as figuras de primeira grandeza no panorama da poesia afro-brasileira.


Nos anos subsequentes houve mudanças na composição do Grupo Palmares, com a entrada, entre outros, de Helena Vitória dos Santos Machado (1943-) e depois Marisa Souza da Silva. Segundo Oliveira Silveira, elas “foram integrantes cuja participação contribuiu decisivamente para o ajuste do trabalho ao contexto das lutas sociais”. E o Grupo Palmares continuaria promovendo, entre 1972 e 1977, debates, encontros, reuniões, exposições e comemorações em torno do Vinte de Novembro. Uma Mini-História do Negro Brasileiro foi lançada por eles em 1976.


As atividades do Grupo Palmares foram paralisadas em 1978 devido a “divergências internas”, só retornando em 1980, já com a criação do “grupo de trabalho – GT Palmares do MNU”, uma articulação política com o MNUCDR (Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial), criado em junho de 1978, em São Paulo. Mas, antes disso, o 20 de Novembro começaria a ser invocado por intelectuais e entidades em várias partes do Brasil, como o Grupo Teatro Evolução de Campinas (SP) e o Centro de Cultura Negra (Cecan). Em Salvador, no mês de novembro de 1978, foi a expressão “Dia Nacional da Consciência Negra”, uma sugestão do militante e intelectual negro carioca Paulo Roberto dos Santos.


Como escritor, Oliveira publicou, até 2005, dez títulos individuais de poesia –Pelo Escuro, Roteiro dos Tantãs, Poema Sobre Palmares, entre outros, além de participar de inúmeras antologias, coletâneas, jornais e revistas no país e no exterior, entre estes Cadernos Negros, do grupo Quilombhoje; Razão da Chama, organizado por Oswaldo de Camargo, São Paulo; Quilombo de Palavras, organizado por Jônatas Conceição e Lindinalva Barbosa, em Salvador, BA; Antologia Contemporânea da Poesia Negra Brasileira, organizado por Paulo Colina, São Paulo, SP; Schwarze poesia/Poesia Negra e Schwarze proza/Prosa negra, organizada por Moema Parente Augel, editada na Alemanha por Étidion diá, em 1988 e 1993, com tradução de Johannes Augel; Revista Callaloo, vol. 18, número 04, 1995; e volume 20, nº 01 (estudo de Steven F. White), 1997, Virgínia, Estados Unidos. Na imprensa, publicou artigos, reportagens, contos e crônicas, entre os quais “Criação Crioula, Nu Elefante Branco”, publicação da Comissão Nacional do I Encontro de Poetas e Ficcionistas Negros Brasileiros, Setembro de 1985, São Paulo, SP, editado em 1987, com o artigo, “A produção literária negra (1975-1985)”.


O escritor Oliveira Silveira participou com artigos e ensaios em obras coletivas, a exemplo do ensaio “Vinte de Novembro: história e conteúdo”, no livro Educação e Ações Afirmativas, organizado pela Profa. Dra. Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva e Válter Roberto Silvério, Ministério da Educação/Inep, Brasília, DF, em 2002. Entre algumas distinções recebidas registramos as seguintes: Menção Honrosa da União Brasileira de Escritores, RJ, pelos originais do livro “Banzo, Saudade Negra”, em 1969; Medalha da cidade de Porto Alegre, concedida pelo executivo municipal, em 1988; Medalha Mérito Cruz e Souza, da Comissão Estadual para a Celebração do Centenário da Morte e Cruz e Souza, Florianópolis, SC, em 1998; Troféu Zumbi, obra do artista plástico negro Américo Souza, concedido pelo clube social negro Associação Satélite Prontidão, em 1999; Comenda Resistência Escrava Anastácia, evento cultural “Rua do Perdão”, Porto Alegre, RS; “Tesouro Vivo Afro-Brasileiro”, homenagem do II Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros, Copene, entre 25 a 29 de agosto de 2002, Universidade de São Carlos, São Carlos, SP.


O escritor e poeta Oliveira atuou em diversos grupos culturais, a contar de meados da década de 70, do século XX, tais como: Razão Negra, Revista Tição, Semba Arte Negra, Boletim Eletrônico Negraldeia, Comissão Gaúcha de Folclore, Conselheiro no Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial – CNPIR, órgão consultivo, entre 2002-2007, no primeiro mandato da ministra Matilde Ribeiro.


Efetuou diversos exercícios em textos teatrais e paradidáticos (cenas, montagens simples) e música popularesca e teve seus poemas musicados por Haroldo Mais, Wado Barcelos, Airton Pimentel, Luiz Wagner, Marco de Farias, Paulo Romeu, Flávio Oliveira, Vera Lopes, Nina Fola e Lessandro. Na Suécia, pela compositora Tebogo Monnakgotla.


A recuperação real da importância do negro na formação da história sulina ganhou maior interesse por corresponder à tentativa de recompor um equilíbrio perdido, pois se a história do negro no Norte e no Nordeste do país é cheia de lacunas, ela o é ainda mais no que diz respeito à realidade gaúcha, onde se pretendeu criar o mito da inexistência de formas de resistência negra. Os versos que procuram iluminar os desvãos da história e urdir a epicidade do negro no extremo Sul do Brasil emergem com redobrado vigor porque a voz do poeta soma-se à do povo que pretende reavaliar. Esta fase afro-gaúcha de sua obra é desenvolvida principalmente nas seguintes publicações: Décima do negro peão (1974); Poemas regionais (1968) e Pêlo Escuro (1968-1977).


O viés épico, presente na obra de Oliveira Silveira, emerge para louvar a ação transgressora de Zumbi dos Palmares. A exemplo de Solano Trindade, que também compôs um poema para resgatar a epopeia palmarina, Oliveira busca contornos épicos em poema sobre Palmares (1972-1987), louvando ao mesmo tempo o território-símbolo da liberdade como seu líder maior. Os repetidos ataques ao maior de todos os quilombos são referidos, enaltecendo-se a bravura dos quilombolas que resistiram durante anos. É como se o poeta quisesse mostrar a seus contemporâneos o exemplo a ser seguido nos dias de hoje, quando os ataques representados nas atitudes racistas dos brancos ainda são constantes. Uma leitura possível do poema: o sangue de Zumbi não foi derramado em vão: foi o húmus onde germinou a semente de inúmeras rebeliões escravas que brotaram mais tarde, como a Guerra dos Malês, Cabanagem, Balaiada, além dos quilombos espalhados por todo o Brasil, inclusive no Rio Grande do Sul. “Palmares não é um só, são milhares”, ensina o poeta.


A concepção identitária de Oliveira Silveira tende ao enraizamento, a construção de um tipo de identidade voltada sobre a própria comunidade negra, nem sempre predispondo-se à salutar abertura ao outro, à diversidade e à relação. Sua concepção de literatura negra, muitas vezes referida oralmente em congressos e seminários, não mudou ao longo dos anos, permanecendo à pertença à etnia negra. Para Oliveira Silveira, a literatura negra é aquela feita por negros, o que constitui – a nosso ver – um critério epidérmico/racial que está na contramão de vertentes profícuas de poesia negra como a caribenha, por exemplo, para as quais os essencialismos da Negritude, fundada tão somente na preservação dos ‘valores negros’ e restringindo o alcance universal da poesia, são coisa do passado. No entanto, sua contribuição à assim chamada poesia negra brasileira, ou afro-brasileira, ou ainda afrodescendente, como vem sendo chamada atualmente, é de grande vigor e originalidade ao vincular a comunidade negra à ‘gauchidade”, obrigando de certa forma as manifestações identitárias a adquirirem um viés heterogêneo.


Para o poeta e crítico literário Ronald Augusto, Oliveira Silveira “... além de estar atento às questões históricas e sociais dos afro-brasileiros, também respondeu crítica e criativamente ao seu tempo-espaço porque não descurou quer das relações relativas à tradição poética (diacronia), quer das relativas à função poética (sincronia)”. Seus livros foram editados na capital gaúcha e em tiragem limitada. São, portanto, dificilmente encontráveis, estando a merecer uma edição atualizada reagrupando o conjunto da produção poética do autor. Esforço nesse sentido foi levado a cabo com a publicação, em fins de 2009, de antologia poemas, com seleção e prefácio de Oswaldo de Camargo.


Em sua homenagem e reconhecimento da sua obra literária e intelectual, a Biblioteca da Fundação Cultural Palmares recebeu o nome de “Oliveira Silveira”; a Casa de Cultura Mário Quintana, em Porto Alegre, a “Sala Oliveira Silveira” ampliou seu espaço, o qual passou a ser designado de “Espaço Oliveira Silveira”, onde se mantém uma exposição permanente. No município de Osório, Litoral Norte do RS, foi inaugurada a Biblioteca Municipal Oliveira Silveira, no dia 13 de novembro de 2015, onde está parte do acervo contendo obras do poeta, autores negros (literatura afro-brasileira), literatura brasileira e sobre o movimento social negro, autores africanos e negros norte-americanos. O poeta e escritor Oliveira Silveira faleceu em Porto Alegre, no dia 1º de janeiro de 2009, já consagrado em termos literários e considerado “O Poeta da Consciência Negra”.


BIBLIOGRAFIA DE OLIVEIRA SILVEIRA:

Germinou: poemas, Edição do Autor, Porto Alegre, 1962.

Poemas Regionais, Edição do Autor, Porto Alegre, 1968.

Banzo, Saudade negra: poemas, Edição do Autor, Porto Alegre, 1970.

Décima do Negro Peão, Edição do Autor, Porto Alegre, 1974.

Praça da Palavra, poemas, Porto Alegre, 1976.

Pêlo Escuro: poemas afro-gaúchos, Edição do Autor, Porto Alegre, 1977.

Roteiro dos tantãs: Porto Alegre, Edição do Autor, 1981.

Poema sobre Palmares, Edição do Autor, Porto Alegre, 1987.

Anotações à margem. Porto Alegre, SMC, Coordenação do Livro e Literatura, Unidade Editorial Porto Alegre, 1994. (série Petit POA).

Orixás: pintura e poesia. Porto Alegre: SMC, Coordenação do Livro e Literatura, Unidade Editorial, Porto Alegre [1995]. Ilustrações a partir de pinturas do artista plástico negro Pedro Homero.

Bandoné do Caverá. Porto Alegre. Edição do Autor, 2008.

Poemas: Antologia, Porto Alegre, Edição dos Vinte, 2009.


Antologia Poética de Oliveira Silveira, obra completa de poesia. Rosário do Sul. VCS,2010.

Oliveira Silveira – Obra Reunida, AUGUSTO, Ronald (Org. ) Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, RS, 2012.


PARTICIPAÇÃO EM ANTOLOGIAS E COLETÂNEAS

Cadernos Negros 3 – poesia, São Paulo, Ed. Do Autor, 1980.

Axé – Antologia contemporânea da poesia negra brasileira (org.) Paulo Colina, São Paulo, Global Editora, 1982.

Cadernos Literários 19 – Poetas Negros do Brasil, Porto Alegre, Instituto Cultural Português, Edições Caravelas, 1983.

A Razão da Chama – Antologias de Poetas Negros Brasileiros (coordenação e seleção de Oswaldo de Camargo, São Paulo, GRD, 1986.

O Negro Escrito – Apontamento sobre a presença do Negro na Literatura – Antologia Temática – São Paulo, Secretaria de Estado da Cultura/Assessoria de Cultura Afro-Brasileira, 1987.

Cadernos Negros 11 – Poemas, São Paulo, ED. dos Autores, 1986.

Schwarze Poesia/Poesia Negra (Org. Moema Parente Augel), tradução de Johannes Augel, St. Gallen/Köln, Edition Diá, 1988.

Poesia Negra Brasileira: Antologia (org. Zilá Bernd), Porto Alegre, AGE/IEL/IGEL, 1992


FICÇÃO – CONTO

Zumbi in der Favela (Zumbi no Morro), in Schwarze Prosa/Prosa Negra (Org. Moema Parente Augel); tradução Johannes Augel), St. Gallen/Berlin/, São Paulo, 1993.


OUTROS

Rosário Centenário – História, Atualidades e Perspectivas (Coordenação de Oliveira Silveira), Rosário do Sul, Prefeitura Municipal, 1976.

Mini-História do Negro Brasileiro – Uma Síntese (co-autoria: Anita Leocádia Prestes Abad et al.), Porto Alegre, SMEC, 1986.

A Produção Literária Negra (1975 – 1985) – Ensaio, In: Criação Crioula nu Elefante Branco (Organização da Comissão Nacional do 1º Encontro de Poetas Ficcionistas Negros Brasileiros), São Paulo, Governo do Estado, 1987.

Nós, Os Negros (ensaio) In: Nós, Os Gaúchos (Coordenação de Sergius Gonzaga e Luís Augusto Fischer), Porto Alegre, Porto Alegre, Editora da Universidade/UFRGS, 1992, (2ª ed. , 1993).

Nós, os Afro-Gaúchos (participação com poemas (Coordenação de Euzébio Assumpção e Mário Maestri) Porto Alegre, Ed. da Universidade/UFRGS, 1986.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


AUGUSTO, Ronald (Org. ) Oliveira Silveira – Obra Reunida, Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, RS, 2012.

BERND, Zilá. Oliveira Silveira. In: DUARTE, Eduardo de Assis (Org.) Literatura e Afrodescendência no Brasil: antologia crítica, Volume 2, Consolidação, Editora Ufmg, Belo Horizonte, Belo Horizonte, 2011.


BOEIRA, Eloísa Elena Prates. Pêlo Escuro: a poesia afro-brasileira de Oliveira Silveira. PPG em Estudos da Linguagem, Mestrado em Literatura Comparada, CCHLA, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, 2013.


CADERNOS DA EXPOSIÇÃO DO MARS (Museu Antropológico do Rio Grande do Sul), “Palmares não é só um, são milhares: 50 anos do 20 de novembro” (Org. Mônica Wiggers, Juliana koenig e Alice Silveira, MARS, IEL, Porto Alegre, 2022.


FiLiGram, Feira do Livro de Gramado, Gramado, RS, 2022.

GOMES, Flávio dos Santos; LAURIANO, Jaime e SCHWARCZ, Lilia Moritz. Enciclopédia Negra, Companhia das Letras, SP, 2021.


Revista Eparrei. Casa de Cultura da Mulher Negra, 1º semestre, nº 6, Ano III, 1º Semestre, Santos, SP, 2004.

SILVA, Jônatas Conceição da Silva. Vozes Quilombolas – uma poética brasileira, Edufba, Ylê Aiyê, Salvador, 2004.







Atualizado: 14 de out. de 2024



Nego Lua é uma referência para o ativismo militante negro contemporâneo. Batizado com o nome de José Alves Bittencourt, nasceu em Bagé, em 29 de julho de 1942, mas foi em Porto Alegre, onde passou a ser conhecido como Lua, que se construiu como um ativista na luta pela igualdade racial e por uma sociedade mais justa de direitos e cidadania. Foi a vivência nos espaços de sociabilidade negra e a formação política que forjaram essa militância. Embora tivesse pouca escolaridade formal, era reconhecido e respeitado pela leitura e interpretação na prática cotidiana de clássicos da literatura política. Nos anos 1970, foi um dos fundadores do Movimento Negro Unificado (MNU). Na década seguinte, ajudou a fundar e organizar, no Estado, o Partido dos Trabalhadores (PT), onde coordenou o núcleo negro do partido no Rio Grande do Sul. Incansável, no final dos anos 1990 e começo do novo século, passou a coordenar a Assessoria de Políticas Públicas para o Povo Negro na Frente Popular da Prefeitura de Porto Alegre (governos petistas de 1989 a 2002).

No entanto, suas marcas mais conhecidas são o fato de ter idealizado e criado o Grupo de Trabalho Angola Janga, em 11 de novembro de 2002, que é como os portugueses chamavam o Quilombo dos Palmares, expressão que significa “Angola Pequena”, e onde a ideia de quilombo pode ser entendida como uma sociedade mais igualitária. Outro foco de luta do militante foi pela construção do Centro de Referência Afro-brasileiro (CRAB). Idealizado para ser um espaço agregador e propositivo para o ativismo negro em torno das lutas por igualdade racial, ele não foi realizado, mas continua na pauta de boa parte das associações do movimento – em grande parte, seguramente, pela tenacidade com que Nego Lua defendia essa ideia. O trabalho deste idealista, entretanto, está visível quando se percorre a cidade no Museu de Percurso do Negro, obra de que foi, também, um dos idealizadores, tendo lutado arduamente para que fosse realizada, o que fez presidindo o Conselho Gestor do Museu até 10 de novembro de 2009, ano em que faleceu sem ver erguido O Tambor, primeiro e significativo marco do Museu.


Nego Lua passou a maior parte da sua juventude morando na Rua Cabo Rocha (hoje Prof. Freitas de Castro), um dos locais da cidade marcados pela sociabilidade negra. Sua atividade laboral como carregador e estivador no porto da capital é sinônimo de um dos tipos de trabalho realizado majoritariamente por negros. Fato pouco conhecido, mas importante para se entender o percurso militante do Nego Lua, foi ele ter sido um dos fundadores e proprietário, por breve período, do bar Luanda, na Rua José do Patrocínio, 988. Lua só conseguiu comprá-lo, segundo Daniela Espíndola, por meio de indenização após sofrer acidente durante seu trabalho no porto. Foi fundamental ainda para a sua formação militante, o diálogo que veio a estabelecer nos anos 1970 com Helena Vitória Machado e Oliveira Silveira.






Referências:


ESPÍNDOLA, Daniela Rodrigues. Nego Lua: o legado de um importante e influente militante negro de Porto Alegre. Concurso Décio Freitas/ Funproarte-SMC. Porto Alegre. 2015.

VILASBOAS, Ilma Silva; BITTENCOURT JÚNIOR, Iosvaldyr C; SOUZA, Vinicius Vieira. Museu de Percurso do Negro em `Porto Alegre. Editora Porto Alegre, 2010


Nossos objetivos na 2ª edição

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Confira as metas da segunda edição do projeto MEMÓRIAS NEGRAS EM VERBETES – Inventário Participativo de Referências Espaciais, Sociais e Simbólicas Projeto realizado com recursos da Lei Complementar nº 195/2022. 

01

+ 50 Verbetes no site

A segunda edição prevê em suas metas a publicação de mais 50 verbetes, totalizando 100 verbetes no blog até o final desta etapa.

03

Mobilização da comunidade

Mobilizar pessoas representativas e instituições do movimento negro porto-alegrense para debater o projeto.

02

Audiodescrição dos conteúdos do site

Nosso projeto agora terá o recursos de audiodescrição, tornando a pesquisa acessível a mais pessoas.

04

Audiolivro

Montar Audiolivro unindo os episódios do Desapaga POA e do Memórias Negras em Verbetes.

Reportagens

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Verbetes em destaque

O Príncipe Custódio, figura histórica envolta em mistério, faleceu em Porto Alegre em 1935 e nasceu na África no século XIX. Duas narrativas principais disputam sua origem: uma o vincula à realeza do Benin, atribuindo-lhe importância no batuque e no assentamento do Bará do Mercado, enquanto outra o identifica como filho de um comerciante de escravos africano, chegando a Porto Alegre após disputas familiares. Custódio se destacou na cidade tanto por sua participação nas corridas de cavalos quanto por sua liderança religiosa, sendo reconhecido por sua influência nos cultos africanos e por seu papel de mediador entre a população negra e a elite. Seu legado segue relevante para o movimento negro e para as discussões políticas e religiosas no Rio Grande do Sul.

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Príncipe Custódio

Lupicínio Rodrigues, nascido em Porto Alegre em 1914, destacou-se como um dos maiores compositores da música brasileira, conhecido como o mestre da "dor de cotovelo". Desde cedo, transitou pela boemia e pela música, conciliando sua trajetória com uma breve passagem pelo exército e uma vida marcada por empreendedorismo e engajamento social. Suas composições, como Se Acaso Você Chegasse e Nervos de Aço , tornaram-se clássicos, interpretados por grandes nomes da música. Gremista fervoroso, compôs o hino do Grêmio e participou ativamente da cena cultural e política, chegando a disputar uma eleição. Mesmo reconhecidos nacionalmente, episódios de racismo, o que reforçou seu papel na luta pelos direitos da comunidade negra. Faleceu em 1974, deixando um legado imortal na música popular brasileira.

Lupicínio Rodrigues

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Tambor – Museu de Percurso do Negro

O Tambor Amarelo, instalado na Praça Brigadeiro Sampaio em 2010, tornou-se um símbolo da presença e trajetória do negro em Porto Alegre, sendo um marco do Museu de Percurso do Negro. Concebido por um coletivo de artistas e griôs, com base em uma pesquisa antropológica de Iosvaldyr Bittencourt, a obra foi desenvolvida em um processo coletivo inspirado em valores civilizatórios africanos. Além de resgatar a memória negra no antigo Largo da Forca, o tambor representa a diversidade cultural afro-brasileira e denuncia a pouca representatividade da cultura africana nos monumentos da capital gaúcha. Hoje, a escultura fortalece a identidade negra e ressoa com imigrantes africanos e latino-americanos que chegam ao Rio Grande do Sul. O trabalho dos artistas e griôs envolvidos reforça a importância da arte coletiva e da ancestralidade na construção da memória urbana. Mais do que um monumento, o Tambor Amarelo é um convite ao reconhecimento e à valorização da história negra na cidade.

Pelópidas Thebano Ondemar Parente (1934-2022) foi um renomado artista plástico, desenhista e figurinista de Porto Alegre, destacando-se na arte afrocentrada e no carnaval da cidade. Servidor público por décadas, contribuiu com projetos arquitetônicos e participou da concepção do Aeromóvel. Suas obras abordam a diáspora africana e a identidade negra, refletindo sobre a influência cultural afro-brasileira. Foi um dos idealizadores da Frente Negra de Arte e autor de marcos visuais do Museu de Percurso do Negro, como o Tambor Amarelo. Seu legado é reconhecido em diversas exposições e premiações, consolidando-o como uma referência na arte negra no Rio Grande do Sul.

Pelópidas Thebano

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Wilson Tibério (1916-2005), conhecido como Tibério, foi um artista afro-brasileiro engajado no debate antirracista e colonialista do século XX. Natural de Porto Alegre, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou na Escola Nacional de Belas Artes, destacando-se por sua arte voltada à vivência da população negra. Em 1947, emigrou para a França, viajando por diversos países e se aproximando do movimento Négritude. Sua produção artística denunciava o colonialismo e exaltava a diáspora africana, com obras que hoje integram acervos como a Pinacoteca Ruben Berta, a UFRGS e o Museu Afro Brasil.

Wilson Tibério

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A Ilhota era uma pequena porção de terra na Cidade Baixa, Porto Alegre, formada pelo meandro do Arroio Dilúvio e delimitada pelas atuais avenidas Getúlio Vargas e Érico Veríssimo. Surgida em 1905, tornou-se um núcleo habitado por uma população majoritariamente negra e de baixa renda, conhecida por sua forte tradição boêmia e carnavalesca, sendo berço do samba e lar de Lupicínio Rodrigues. Com a canalização do Arroio Dilúvio após a enchente de 1941, a área foi alvo de interesse imobiliário e sofreu uma brutal remoção populacional no final da década de 1960, deslocando muitos moradores para a Restinga, então uma periferia sem infraestrutura adequada.

Ilhota

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Durante o século XIX, os Campos da Redenção, inicialmente uma grande várzea alagadiça fora da cidade de Porto Alegre, foram um importante local para celebrações culturais e religiosas da população negra, como o Candombe da Mãe Rita e outros batuques, realizados com tambores e danças. Esses festejos, mencionados por cronistas da cidade, ocorreram especialmente na área ao redor da atual rua Avaí e nas proximidades da Capelinha do Bom Fim. Em 1884, a Várzea foi oficialmente renomeada para Campos da Redenção para comemorar a libertação dos escravizados em Porto Alegre, embora a abolição tenha sido limitada e parcial, com muitos negros ainda vivendo como libertos ou escravizados. A nova denominação refletia o legado da resistência e presença cultural dos negros na cidade.

Campos da Redenção

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Dario de Bittencourt, nascido em 1901, foi um importante advogado, educador e ativista negro, com uma trajetória marcada pela luta contra o preconceito racial e pela valorização das tradições culturais negras. Criado por seu avô após a morte do pai, Dario teve uma educação privilegiada, estudando em instituições renomadas e se graduando em Direito pela Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. Ao longo de sua vida, foi membro ativo de diversas organizações negras, como a Sociedade Beneficente Floresta Aurora e o Grêmio Náutico Marcílio Dias, e participou ativamente do jornal O Exemplo, que combatia o racismo. Além disso, Dario se envolveu com religiões de matriz africana, defendendo a aceitação do Candomblé como religião legítima. Em sua carreira acadêmica, foi professor catedrático de Direito Internacional Privado na Universidade do Rio Grande do Sul e se aposentou em 1957, mantendo seu compromisso com a luta contra a discriminação racial até sua morte.

Dario de Bittencourt

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Em 2 de julho de 1949, a Folha da Tarde fez um convite aberto aos homens de cor de Porto Alegre para a fundação de um clube náutico, inicialmente chamado José do Patrocínio, mas que recebeu o nome de Marcílio Dias, em homenagem ao intelectual negro. O Clube foi criado com o objetivo de proporcionar aos jovens negros o acesso a esportes como remo e natação, atividades que eram negadas pelos clubes brancos da cidade. Fundado em 4 de julho de 1949, o clube teve como principais articuladores figuras como João Nunes de Oliveira e Armando Hipólito dos Santos. Em 1950, abriu oficialmente sua sede na Avenida Praia de Belas, sendo um ponto de encontro para festas e eventos importantes da comunidade negra local. Na década de 1960, o clube lançou o jornal Ébano, e embora tenha enfrentado dificuldades com sua sede, incluindo a construção de um ginásio destruído por ventos fortes, o clube seguiu promovendo atividades até seu fechamento na década de 1970.

Clube Náutico Marcílio Dias

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A área do atual bairro Mont'Serrat, até meados do século XX e talvez até as décadas de 1980/90, era conhecida como a Bacia do Mont'Serrat, um território predominantemente negro com registros desde o início do século XX. O bairro teve sua origem marcada pela presença de famílias negras, com destaque para a Rua Arthur Rocha, nomeada em homenagem ao dramaturgo negro Arthur Rodrigues da Rocha. A Bacia do Mont'Serrat foi uma área de forte religiosidade, com várias casas de batuque e terreiros de matriz africana, e se tornou um ponto de encontro de trabalho e sociabilidade para as famílias negras da região, com destaque para atividades como a lavagem de roupas e o trabalho de costureiras. Além disso, o bairro foi berço de tradições culturais como blocos de carnaval e piqueniques dominicais. No entanto, com o processo de urbanização e transformação social, o antigo território negro se perdeu, embora ainda resista uma presença negra na região.

Bacia do Mont'Serrat

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