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O PROJETO MEMÓRIAS NEGRAS EM VERBETES – Inventário Participativo de Referências Espaciais, Sociais e Simbólicas realiza um levantamento visando o resgate e desapagamento da presença das populações negras na história de Porto Alegre.

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Verbetes

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Imagem meramente ilustrativa - feita por IA - por não haver registro gráfico.

Em 26 de novembro de 1829, a Câmara Municipal de Porto Alegre apreciou o requerimento de Francisco Bernardo da Silva, preto forro de Nação Congo, intitulando-se rei eleito dela, que postulava licença para ensaiar nas ruas e na igreja de Nossa Senhora do Rosário para os festejos de costume. 


O postulante deu como períodos necessários para os ensaios a festividade de Natal, que então se avizinhava, ocasião em que também era festejada a santa para a qual foi dedicada a igreja recém-construída (em 1828) pela Irmandade do Rosário. A Irmandade, em si, era mais antiga, fundada em 1786.


O aparecimento desse personagem como fonte histórica inédita é destacado pelo historiador Jovani Scherer como demonstração da prática inequívoca do candombe (danças e cânticos) e da coroação de reis e rainhas africanas como parte da realeza frequente nas congadas e cucumbis, que pode ser lido, com alguma liberdade, como inserido no universo de rituais do povo de origem banta, naquele momento majoritário na demografia da cidade.


A entronização dessa realeza em território além-África pode ser percebida como parte de um contexto de apropriação por parte da população negra de um catolicismo de concepção africana que começa no reino do Congo, na segunda metade do século XV, antes mesmo da materialização da dolorosa diáspora dessas populações para o Brasil e América Latina. 


As manifestações plasmadas nas congadas e cucumbis podem ser vistas como cimento para a identidade dos negros das várias nações, em especial dos reinos centro-africanos de cultura banta. 


Na antiga colônia portuguesa, depois Império do Brasil, tais manifestações eram permitidas, porém com filtros de várias camadas de censura para os membros das irmandades católicas, em particular, no caso de Porto Alegre, pela Irmandade do Rosário. 


“O Compromisso” – documento norteador da entidade - na capital do Rio Grande do Sul, permitia a negros e pardos formarem a mesa diretora da Irmandade. Além de tesoureiro e secretário, a mesa diretiva contava com o cargo de rei, o que assegurava o status de autoridade e notoriedade a Francisco Bernardo da Silva perante sua comunidade.


A coroação do rei congo, formatada em ritual que tem por base uma espécie de catolicismo de inspiração africana, tem origem provável, como pensa Laurentino Gomes, na conversão do rei do Congo, titulado “manicongo” - Nzinga-a-Nkuwa - no ano de 1485, quando recebe o batismo cristão mudando o nome para João I, homônimo do soberano português. 


A conversão da majestade congolesa foi a oportunidade para a existência até a atualidade nessa região da África de uma forma de catolicismo peculiar que mistura crenças e rituais de origem católica com outros de raiz local, ancestral e africana.

A prática reiterada de coroação do rei Congo e da rainha Jinga nas congadas e cucumbis pode ser aproximada da construção de uma comunidade de origem, de um modo próprio de ver o mundo e de fortalecimento identitário que irá contribuir para a criação de estratégias comunitárias de negociação no seio de uma sociedade racista, adversa e assimétrica.


Assim sendo, a aparição desse personagem, Francisco Bernardo da Silva – Rei Congo, nas atas da Câmara Municipal da primeira metade do século XIX, traz, pela força da tradição, a incontornável presença do negro na sua diversidade de nações originárias e culturas, para o centro de uma contra narrativa que busca superar a versão hegemônica de que Porto Alegre seria uma cidade essencialmente europeizada.


Referências:

  • GOMES, Laurentino. Escravidão: do primeiro de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares, volume 1 – 1 ed. – Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019.


  • MULLER, Liane Susan. As Contas do Meu Rosário são Balas de Artilharia. Porto Alegre: Pragmatha, 2013.


  • SCHERER, Jovani de Souza. O Candombe, Um Rei Congo e as tradições africanas em Porto Alegre, no início do século XIX. Racismo, relações de poder e história negra em Porto Alegre: séculos XIX-XX/Centro Histórico-Cultural Santa Casa; org. José Rivair Macedo, Paulo Roberto Staudt Moreira, Vera Lúcia Maciel Barroso- Porto Alegre: Evangraf: ISCMPA,2023.

 
 
 
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As tribos carnavalescas de Porto Alegre representam uma das tradições mais emblemáticas e originais do carnaval gaúcho, sendo uma fusão das influências indígenas e afro-brasileiras que resulta em uma identidade única. 


Surgidas entre as décadas de 1940 e 1950, essas tribos ofereceram uma alternativa opular ao carnaval elitizado dos salões, destacando-se inicialmente no carnaval de rua. Criadas por moradores da periferia, elas refletiam a busca por um espaço de pertencimento e a afirmação cultural, num contexto em que o poder público incentivava os “carnavais de bairro”, festas comunitárias que reuniam as pessoas em torno de blocos e escolas de samba.


O contexto histórico do surgimento das tribos está diretamente relacionado ao processo de busca por uma identidade nacional nos anos 1930 e 1940, período em que o indígena passou a ser simbolicamente associado à brasilidade. 


Inspirados por essa construção de identidade, as tribos surgiram nas áreas periféricas de Porto Alegre como uma forma de se contrapor ao carnaval sofisticado e restrito aos clubes da elite, nos quais os mais pobres não tinham acesso.


Ao longo dos anos, essas manifestações se consolidaram como um símbolo de resistência e de valorização da cultura popular que passou a ter um espaço de expressão nas avenidas do carnaval oficial da cidade, onde foi criada uma premiação especial para as tribos.


"Os Comanches" e "Os Guaianazes" - denominação dos grupos mais premiados - distinguiam-se pelas fantasias que remetiam ao universo indígena, particularmente ao dos

norte-americanos, uma provável influência da visão indígena da época, quando no cinema e na televisão predominavam os filmes em torno da ocupação do Oeste americano.


No entanto, essas tribos não se limitavam a imitar ou reproduzir aquelas figuras da estética indígena dos filmes de cowboy. Era evidente a incorporação também de diversos elementos da cultura afro-brasileira, criando deste modo uma representação única e multifacetada para identidade popular. 


O “índígena guerreiro” era a figura central nas fantasias e nos desfiles, não apenas como um símbolo de força e coragem, mas como uma forma de afirmar o pertencimento e a identidade da comunidade que participa da festa.


Um dos momentos mais emblemáticos do carnaval das tribos dava-se no “jogo da guerra”,

uma competição simbólica e carregada de rituais entre as tribos, especialmente entre "Os

Comanches" e "Os Guaianazes". 


Tal disputa ia além da rivalidade. Era uma celebração da identidade e da criatividade dos participantes, expressa na síntese entre fantasias, danças e músicas. O jogo acontecia não apenas na avenida dos desfiles carnavalescos, mas também em um espaço simbólico onde a rivalidade misturava-se com respeito e cooperação. 


As fantasias, criadas de forma colaborativa, tinham a contribuição fundamental das mulheres e de diversos artistas visuais do meio popular que desenhavam e construiam suas

as roupas baseadas nos temas do ano. A improvisação era um aspecto crucial desse processo, o que garantia que cada desfile fosse repleto de surpresas e inovações.


Desse modo, é possível afirmar que a identidade das tribos carnavalescas de Porto Alegre é fluida e dinâmica, construída no próprio processo criativo do carnaval. As danças, os ritmos e as interações entre os membros das tribos formavam o tecido dessa identidade, que transcendia a ideia fixa do "índígena" ou "afrodescendente". 


Embora as tribos carnavalescas de Porto Alegre tenham reduzido sua popularidade e presença no carnaval da cidade no período mais recente, havendo apenas duas ainda ativas - justamente as tradicionais "Os Comanches" e "Os Guaianazes" - elas continuam a

representar uma forma de resistência e preservação da cultura popular e uma marca totalmente original no carnaval porto-alegrense em comparação com o restante do país.. 


Mesmo com o crescimento das escolas de samba a partir da década de 1970, as tribos mantiveram-se vivas na tradição do carnaval de rua, colocando-se como espaços de reinvenção cultural.


Ainda na atualidade, em que pese de forma mais residual, essas entidades como importantes símbolos de pertencimento e resistência, onde a disputa simbólica do “jogo da guerra” é transformada em um ritual de criatividade e luta por diversidade, representatividade social e cultural das periferias na grande cidade. As tribos foram sempre uma alternativa popular ao carnaval elitizado e continuam a ser um exemplo de expressão da cultura de rua em Porto Alegre, uma evidência das raízes populares e da riqueza cultural dessas origens.


Referências:

  •  Moura de Quadros. O batuque do Rio Grande do Sul representado em dois contos de Maria Helena Vargas da Silveira (1940-2009). Revista de Letras 22.38 (2020).


  • Édson Luís Dutra. Escola de samba na mídia: a cobertura do carnaval de Porto Alegre nos jornais Correio do Povo e Zero Hora entre 2001 e 2005. MS thesis. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2023.


  • Luiza Dias Flores. As invenções da guerra: reflexões sobre um jogo carnavalesco. Novos Cadernos NAEA 22.1 (2019).


  • Diversas reportagens de Zero Hora e RBS TV disponíevis nas redes sociais:


LINK:


 
 
 
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Imagem meramente ilustrativa - feita por IA - por não haver registro destes AFRICANOS LIVRES citados no verbete a seguir.

Em 30 de junho de 1857, por despacho de um juiz de direito de então, foi remetido à Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre o boçal Antônio, de nação Cabinda. Boçal era nome que se dava aos negros africanos recém-chegado e ignorantes a respeito dos costumes e dos modos de viver na sociedade escravocrata brasileira.


Situação similar foi vivida por Manoel Congo, remetido à Santa Casa da capital, em 1861. 


Dez anos antes, em 1851, como apontam pesquisas realizadas pelo historiador Vinicius de Oliveira, esta mesma instituição de caridade já havia recebido os 24 primeiros africanos livres legalmente reconhecidos de que se tem registro no Rio Grande do Sul.


A categoria “africanos livres” era concedida a africanos e africanas que entraram no Brasil após 7 de novembro de 1831 (Lei Feijó), devido à proibição do comércio atlântico de escravizados. Essa lei proibiu a importação de escravizados, sendo declarados livres aqueles que haviam sido trazidos ao país após a sua instituição. Deste modo, a nomenclatura “africano livre” vai se juntar às demais formas de identificar a população negra no século XIX: escravos, livres ou libertos. 

No entanto, pode-se dizer que a experssão “africanos livres” ou “emancipados” era um eufemismo para conceituar uma categoria intermediária entre escravidão e liberdade. 


Homens e mulheres enquadrados nessa perspectiva não seriam imediatamente postos em liberdade nem tampouco retornariam ao continente africano, mas sim deveriam cumprir uma espécie de pedágio ou cautela, trabalhando um determinado número de anos para o estado (arsenais da Marinha ou de Guerra, fortalezas, fábricas, casas de correção, entre outros) ou concessionários particulares como as Santas Casas de Misericórdia, podendo em alguns casos receberem uma ínfima remuneração. 


A justificativa era a necessidade de adaptação ao estado escravista brasileiro antes da concessão da liberdade plena.

A entrada desse grupo no estado e na capital em particular vai colaborar de forma decisiva para a paulatina mudança demográfica no seio da população negra. 


Até então, vislumbrava-se um quadro populacional majoritariamente de origem banta, responsável, com algumas exceções, pelas manifestações religiosas relacionadas às congadas e à coroação de reis e rainhas africanas, expresões estas ligadas às irmandades católicas, em especial a do Rosário, numa espécie de catolicismo de inspiração africana.


Provavelmente, a origem dessas tradições de cunho religioso pode ser vista no distante ano de 1485, antes da ocupação portuguesa do Brasil, quando o manicongo – rei do Congo - chamado Nzinga-a-Nkuwa - recebeu o batismo cristão, mudando o nome para João I, homônimo do soberano português. 


Como pensa Laurentino Gomes, esse fato foi a oportunidade para o nascimento de uma peculiar forma de catolicismo, até hoje vigente nessa região da África, que mistura crenças e rituais de origem católica com outros de raiz local, ancestral e genuinamente africana. 


No Brasil a situação de escravizados, com quase toda a certeza gerou novos códigos de sociabilidade cimentando uma identidade negra em terras estrangeiras.


A partir de 1831, entretanto, nota-se uma maior diversidade étnica entre os grupos que irão compor a população negra no RS, em particular nas cidades de Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre. Não por acaso, localidades que apresentam ligação fluvial com o único porto marítimo do estado, região onde ocorrem apreensões de transporte clandestino de africanos.


Diferente da maior concentração de povos negros na capital, a maioria oriunda da costa oeste da África Central – macrorregião que compreende Angola e Congo – de cultura banta, os novos entrantes negros eram originários das regiões acima da linha do equador, conhecida por Costa do Ouro, Costa dos Escravos ou Costa da Mina, com predominância de linhagens de cultura iorubá.


Tal inflexão no quadro demográfico da população negra local, lento, mas em avanço contínuo, vai trazer mudanças significativas para o processo de lutas pela abolição, novas sociabilidades e a abertura para outras perspectivas religiosas, como é o caso do batuque de nação.


Na atualidade, o batuque representa parte importante da identidade negra porto-alegrense, surpreendendo por sua força nas manifestações religiosas negras no estado “mais europeu” do país. 


Pode-se pensar que as marcas profundas da presença negra na moldagem de territórios nos pós-abolição - e mesmo a projeção nos anos vindouros da força da cultura e do movimento negro na cidade - deve-se sobremaneira à diversidade cultural e étnica dos povos negros que aqui fincaram raízes, processo histórico em que, sem dúvida, os africanos livres tiveram papel destacado.


Referências:


OLIVEIRA, Vinicius Pereira. Um pátio étnico: africanos livres na Santa Casa de Porto Alegre. Racismo, relações de poder e história negra em Porto Alegre: séculos XIX-XX/Centro Histórico-Cultural Santa Casa, org. José Rivair Macedo, Paulo Roberto Staudt Moreira, Vera Lúcia Maciel Barroso- Porto Alegre: Evangraf: ISCMPA,2023.


Histórias de batuques e batuqueiros [livro eletrônico]: Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre. Autoria de Vinicius Pereira de Oliveira, Denis Pereira Gomes, Jovani de Souza Scherer – publicado em Pelotas. Edição dos Autores, 2021.


GOMES, Laurentino. Escravidão: do primeiro de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares, volume 1 – 1 ed. – Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019.


 
 
 

Nossos objetivos na 2ª edição

Confira as metas da segunda edição do projeto MEMÓRIAS NEGRAS EM VERBETES – Inventário Participativo de Referências Espaciais, Sociais e Simbólicas Projeto realizado com recursos da Lei Complementar nº 195/2022. 

01

+ 50 Verbetes no site

A segunda edição prevê em suas metas a publicação de mais 50 verbetes, totalizando 100 verbetes no blog até o final desta etapa.

03

Mobilização da comunidade

Mobilizar pessoas representativas e instituições do movimento negro porto-alegrense para debater o projeto.

02

Audiodescrição dos conteúdos do site

Nosso projeto agora terá o recursos de audiodescrição, tornando a pesquisa acessível a mais pessoas.

04

Audiolivro

Montar Audiolivro unindo os episódios do Desapaga POA e do Memórias Negras em Verbetes.

Reportagens

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Verbetes em destaque

O Príncipe Custódio, figura histórica envolta em mistério, faleceu em Porto Alegre em 1935 e nasceu na África no século XIX. Duas narrativas principais disputam sua origem: uma o vincula à realeza do Benin, atribuindo-lhe importância no batuque e no assentamento do Bará do Mercado, enquanto outra o identifica como filho de um comerciante de escravos africano, chegando a Porto Alegre após disputas familiares. Custódio se destacou na cidade tanto por sua participação nas corridas de cavalos quanto por sua liderança religiosa, sendo reconhecido por sua influência nos cultos africanos e por seu papel de mediador entre a população negra e a elite. Seu legado segue relevante para o movimento negro e para as discussões políticas e religiosas no Rio Grande do Sul.

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Príncipe Custódio

Lupicínio Rodrigues, nascido em Porto Alegre em 1914, destacou-se como um dos maiores compositores da música brasileira, conhecido como o mestre da "dor de cotovelo". Desde cedo, transitou pela boemia e pela música, conciliando sua trajetória com uma breve passagem pelo exército e uma vida marcada por empreendedorismo e engajamento social. Suas composições, como Se Acaso Você Chegasse e Nervos de Aço , tornaram-se clássicos, interpretados por grandes nomes da música. Gremista fervoroso, compôs o hino do Grêmio e participou ativamente da cena cultural e política, chegando a disputar uma eleição. Mesmo reconhecidos nacionalmente, episódios de racismo, o que reforçou seu papel na luta pelos direitos da comunidade negra. Faleceu em 1974, deixando um legado imortal na música popular brasileira.

Lupicínio Rodrigues

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Tambor – Museu de Percurso do Negro

O Tambor Amarelo, instalado na Praça Brigadeiro Sampaio em 2010, tornou-se um símbolo da presença e trajetória do negro em Porto Alegre, sendo um marco do Museu de Percurso do Negro. Concebido por um coletivo de artistas e griôs, com base em uma pesquisa antropológica de Iosvaldyr Bittencourt, a obra foi desenvolvida em um processo coletivo inspirado em valores civilizatórios africanos. Além de resgatar a memória negra no antigo Largo da Forca, o tambor representa a diversidade cultural afro-brasileira e denuncia a pouca representatividade da cultura africana nos monumentos da capital gaúcha. Hoje, a escultura fortalece a identidade negra e ressoa com imigrantes africanos e latino-americanos que chegam ao Rio Grande do Sul. O trabalho dos artistas e griôs envolvidos reforça a importância da arte coletiva e da ancestralidade na construção da memória urbana. Mais do que um monumento, o Tambor Amarelo é um convite ao reconhecimento e à valorização da história negra na cidade.

Pelópidas Thebano Ondemar Parente (1934-2022) foi um renomado artista plástico, desenhista e figurinista de Porto Alegre, destacando-se na arte afrocentrada e no carnaval da cidade. Servidor público por décadas, contribuiu com projetos arquitetônicos e participou da concepção do Aeromóvel. Suas obras abordam a diáspora africana e a identidade negra, refletindo sobre a influência cultural afro-brasileira. Foi um dos idealizadores da Frente Negra de Arte e autor de marcos visuais do Museu de Percurso do Negro, como o Tambor Amarelo. Seu legado é reconhecido em diversas exposições e premiações, consolidando-o como uma referência na arte negra no Rio Grande do Sul.

Pelópidas Thebano

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Wilson Tibério (1916-2005), conhecido como Tibério, foi um artista afro-brasileiro engajado no debate antirracista e colonialista do século XX. Natural de Porto Alegre, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou na Escola Nacional de Belas Artes, destacando-se por sua arte voltada à vivência da população negra. Em 1947, emigrou para a França, viajando por diversos países e se aproximando do movimento Négritude. Sua produção artística denunciava o colonialismo e exaltava a diáspora africana, com obras que hoje integram acervos como a Pinacoteca Ruben Berta, a UFRGS e o Museu Afro Brasil.

Wilson Tibério

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A Ilhota era uma pequena porção de terra na Cidade Baixa, Porto Alegre, formada pelo meandro do Arroio Dilúvio e delimitada pelas atuais avenidas Getúlio Vargas e Érico Veríssimo. Surgida em 1905, tornou-se um núcleo habitado por uma população majoritariamente negra e de baixa renda, conhecida por sua forte tradição boêmia e carnavalesca, sendo berço do samba e lar de Lupicínio Rodrigues. Com a canalização do Arroio Dilúvio após a enchente de 1941, a área foi alvo de interesse imobiliário e sofreu uma brutal remoção populacional no final da década de 1960, deslocando muitos moradores para a Restinga, então uma periferia sem infraestrutura adequada.

Ilhota

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Durante o século XIX, os Campos da Redenção, inicialmente uma grande várzea alagadiça fora da cidade de Porto Alegre, foram um importante local para celebrações culturais e religiosas da população negra, como o Candombe da Mãe Rita e outros batuques, realizados com tambores e danças. Esses festejos, mencionados por cronistas da cidade, ocorreram especialmente na área ao redor da atual rua Avaí e nas proximidades da Capelinha do Bom Fim. Em 1884, a Várzea foi oficialmente renomeada para Campos da Redenção para comemorar a libertação dos escravizados em Porto Alegre, embora a abolição tenha sido limitada e parcial, com muitos negros ainda vivendo como libertos ou escravizados. A nova denominação refletia o legado da resistência e presença cultural dos negros na cidade.

Campos da Redenção

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Dario de Bittencourt, nascido em 1901, foi um importante advogado, educador e ativista negro, com uma trajetória marcada pela luta contra o preconceito racial e pela valorização das tradições culturais negras. Criado por seu avô após a morte do pai, Dario teve uma educação privilegiada, estudando em instituições renomadas e se graduando em Direito pela Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. Ao longo de sua vida, foi membro ativo de diversas organizações negras, como a Sociedade Beneficente Floresta Aurora e o Grêmio Náutico Marcílio Dias, e participou ativamente do jornal O Exemplo, que combatia o racismo. Além disso, Dario se envolveu com religiões de matriz africana, defendendo a aceitação do Candomblé como religião legítima. Em sua carreira acadêmica, foi professor catedrático de Direito Internacional Privado na Universidade do Rio Grande do Sul e se aposentou em 1957, mantendo seu compromisso com a luta contra a discriminação racial até sua morte.

Dario de Bittencourt

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Em 2 de julho de 1949, a Folha da Tarde fez um convite aberto aos homens de cor de Porto Alegre para a fundação de um clube náutico, inicialmente chamado José do Patrocínio, mas que recebeu o nome de Marcílio Dias, em homenagem ao intelectual negro. O Clube foi criado com o objetivo de proporcionar aos jovens negros o acesso a esportes como remo e natação, atividades que eram negadas pelos clubes brancos da cidade. Fundado em 4 de julho de 1949, o clube teve como principais articuladores figuras como João Nunes de Oliveira e Armando Hipólito dos Santos. Em 1950, abriu oficialmente sua sede na Avenida Praia de Belas, sendo um ponto de encontro para festas e eventos importantes da comunidade negra local. Na década de 1960, o clube lançou o jornal Ébano, e embora tenha enfrentado dificuldades com sua sede, incluindo a construção de um ginásio destruído por ventos fortes, o clube seguiu promovendo atividades até seu fechamento na década de 1970.

Clube Náutico Marcílio Dias

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A área do atual bairro Mont'Serrat, até meados do século XX e talvez até as décadas de 1980/90, era conhecida como a Bacia do Mont'Serrat, um território predominantemente negro com registros desde o início do século XX. O bairro teve sua origem marcada pela presença de famílias negras, com destaque para a Rua Arthur Rocha, nomeada em homenagem ao dramaturgo negro Arthur Rodrigues da Rocha. A Bacia do Mont'Serrat foi uma área de forte religiosidade, com várias casas de batuque e terreiros de matriz africana, e se tornou um ponto de encontro de trabalho e sociabilidade para as famílias negras da região, com destaque para atividades como a lavagem de roupas e o trabalho de costureiras. Além disso, o bairro foi berço de tradições culturais como blocos de carnaval e piqueniques dominicais. No entanto, com o processo de urbanização e transformação social, o antigo território negro se perdeu, embora ainda resista uma presença negra na região.

Bacia do Mont'Serrat

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